Assinava com
este título, o 3º Marquês de Rio Maior e 6º Conde de Rio Maior, João António de
Saldanha Oliveira e Sousa, engenheiro civil e oficial de artilharia; autarca, erudito e escritor.
No ano de
1945, quando surge o jornal O Alcoa, o Marquês de Rio Maior inicia nele os seus
artigos sobre S. Martinho do Porto, terra onde reside e pela qual possui uma
verdadeira veneração. Filho adotivo da pérola
da Estremadura, dedica-lhe um esforço estreme na busca dos seus tesouros
históricos, humanos e paisagísticos, transmitidos através de uma escrita
romântica e cuidada.
Transcreveu
diversos documentos históricos e artigos de jornal sobre a vila, e retratou em quadros breves, mas generosos,
a vida dos seus habitantes, as rotinas dos banhistas, o trabalho dos estaleiros,
ou o quotidiano dos pescadores e marítimos.
Por vezes,
en passant, o Marquês de Rio Maior escreveu
também sobre Alfeizerão. Transcrevo aqui um texto seu sobre as fortalezas do concelho de Alcobaça e, sucedendo a este, será publicado o seu registo da lenda
do castelo de Alfeizerão e,
por fim, um artigo sobre a inauguração da luz elétrica em Alfeizerão, um tema
que suporíamos mundano e pobre, mas que o Marquês de Rio Maior consegue
transformar num texto literário de agradável leitura, no qual inclui um citação de cunho etnográfico.
No que toca a este artigo sobre os castelos, existe alguma imprecisão (da fonte utilizada) sobre o que distingue um castelo de uma fortaleza mais pequena (forte ou torre); e, amiúde, uma mescla de factos historicamente admissíveis com efabulações baseadas nesses factos.
Sobre a lenda do castelo de Alfeizerão, não haverá muito a dizer, é uma lenda que nos chega com algumas variantes pela mão de diferentes autores, sendo esta, certamente, a mais elaborada de todas. Não diremos, no entanto, que é apenas uma lenda, porque as lendas, como um verso ou um símbolo, são criaturas voláteis do espírito, que podem permanecer inertes em nós ou levar-nos a cruzar distâncias e ensaiar viagens. Nenhuma coisa é apenas uma coisa, e qualquer coisa pode representar tudo.
Sobre a lenda do castelo de Alfeizerão, não haverá muito a dizer, é uma lenda que nos chega com algumas variantes pela mão de diferentes autores, sendo esta, certamente, a mais elaborada de todas. Não diremos, no entanto, que é apenas uma lenda, porque as lendas, como um verso ou um símbolo, são criaturas voláteis do espírito, que podem permanecer inertes em nós ou levar-nos a cruzar distâncias e ensaiar viagens. Nenhuma coisa é apenas uma coisa, e qualquer coisa pode representar tudo.
(as duas torres - detalhe do pelourinho de Alfeizerão) |
S. Martinho do Porto - leitura de férias
pelo MARQUÊS DE RIO MAIOR
O senhor general João de Almeida, ilustre autor do «Roteiro dos Monumentos militares portugueses», descreve e estuda, na Parte III do seu 2º volume, os que existem ou existiram no distrito de Leiria. Essa parte III compreende 12 capítulos, cada um dos quais é dedicado aos castelos dum concelho apenas.
O capítulo II intitula-se «Monumentos do Concelho de Alcobaça» e trata de 3 castelos e 2 atalaias. Os castelos são os de Alcobaça, Alfeizerão e S. Martinho do Porto; as atalaias, as de S. Domingos e do Facho.
Do Roteiro tão bem organizado pelo senhor general, o que percorremos com prazer e proveito, vamos extrair algumas referências relativas aos Monumentos Militares de Alcobaça, que certamente os cultos leitores de O Alcoa apreciarão.
É de crer que no cabeço onde hoje se veem as ruínas do castelo de Alcobaça haja existido algum castro lusitano-romano. Destruído pelos bárbaros, tê-lo-iam reconstruído no século VI os visigodos. Os moiros, conquistadores da Península, restauraram-no em 716 e deram-lhe o nome de Al-cacer-bem-el-Abbaci.
D. Afonso Henriques tomou em 1147 essa fortaleza, que então se chamava Bem-Ab-Cete e mandou-a reerguer. À sombra dela construiu-se o Mosteiro de Alcobaça.
Na invasão árabe de 1191-1195, o castelo foi destruído. Mandou D. Sancho I reconstruí-lo e doou-o aos Abades do Mosteiro. Arruinado pelo terramoto de 1422, foi restaurado por D. João I, que autorizou o D. Abade de Alcobaça a lançar uma sisa sobre os povos dos coutos, para as despesas dessa restauração.
A artilharia fez-lhe perder todo o valor militar e, por isso, caiu em ruínas, sendo aproveitada a sua pedra para várias construções.
Quanto ao castelo de Alfeizerão, supõe-se que no sítio da Ramalheira, a meio quilómetro a oeste [sic] das suas ruínas, tenha existido um castro lusitano. Uma colónia de Celtas, a convite dos Lusitanos, ter-se-ia estabelecido nesse castro, então costeiro, tornando-o oppidum florescente. Conquistaram-no os Romanos, que o transformaram em poderosa base fortificada de ocupação, e centro administrativo importante, com bom porto militar e comercial.
Tomaram-no em 717 os árabes e, como o mar se tivesse afastado dele pelo crescente assoreamento, construíram outro a oeste, cujas ruínas são as existentes.
Expugnou-o, em 1147, D. Afonso Henriques, reedificou-o e melhorou o seu porto que, pelo constante recuo do mar, perdeu a sua importância, tornando-se inútil o castelo, que acabou por se arruinar.
O castelo de S. Martinho levantava-se no morro do farol, onde teria existido um pequeno castro luso-romano, transformado em forte, provavelmente por D. João III.
A atalaia de S. Domingos era torre que ficava 250 metros a oeste de S. Martinho. Servia também de baliza aos navegantes que demandavam os portos de S. Martinho, Salir e Alfeizerão. Tornada inútil como atalaia, construíram com a pedra dela a atual capela da mesma invocação. Nesta capela o povo passou a acender todas as noites uma luz para orientar os navegantes, até que se inaugurou o farol de S. Martinho.
A atalaia do Facho, grande torre de alvenaria, no alto do mesmo nome, já devia existir quando os Romanos entraram na Península. Com as vigias das Berlengas e outras atalaias costeiras, servia para dar alarme de piratas e corsários à vista.
D. Afonso Henriques tomou em 1147 essa fortaleza, que então se chamava Bem-Ab-Cete e mandou-a reerguer. À sombra dela construiu-se o Mosteiro de Alcobaça.
Na invasão árabe de 1191-1195, o castelo foi destruído. Mandou D. Sancho I reconstruí-lo e doou-o aos Abades do Mosteiro. Arruinado pelo terramoto de 1422, foi restaurado por D. João I, que autorizou o D. Abade de Alcobaça a lançar uma sisa sobre os povos dos coutos, para as despesas dessa restauração.
A artilharia fez-lhe perder todo o valor militar e, por isso, caiu em ruínas, sendo aproveitada a sua pedra para várias construções.
Quanto ao castelo de Alfeizerão, supõe-se que no sítio da Ramalheira, a meio quilómetro a oeste [sic] das suas ruínas, tenha existido um castro lusitano. Uma colónia de Celtas, a convite dos Lusitanos, ter-se-ia estabelecido nesse castro, então costeiro, tornando-o oppidum florescente. Conquistaram-no os Romanos, que o transformaram em poderosa base fortificada de ocupação, e centro administrativo importante, com bom porto militar e comercial.
Tomaram-no em 717 os árabes e, como o mar se tivesse afastado dele pelo crescente assoreamento, construíram outro a oeste, cujas ruínas são as existentes.
Expugnou-o, em 1147, D. Afonso Henriques, reedificou-o e melhorou o seu porto que, pelo constante recuo do mar, perdeu a sua importância, tornando-se inútil o castelo, que acabou por se arruinar.
O castelo de S. Martinho levantava-se no morro do farol, onde teria existido um pequeno castro luso-romano, transformado em forte, provavelmente por D. João III.
A atalaia de S. Domingos era torre que ficava 250 metros a oeste de S. Martinho. Servia também de baliza aos navegantes que demandavam os portos de S. Martinho, Salir e Alfeizerão. Tornada inútil como atalaia, construíram com a pedra dela a atual capela da mesma invocação. Nesta capela o povo passou a acender todas as noites uma luz para orientar os navegantes, até que se inaugurou o farol de S. Martinho.
A atalaia do Facho, grande torre de alvenaria, no alto do mesmo nome, já devia existir quando os Romanos entraram na Península. Com as vigias das Berlengas e outras atalaias costeiras, servia para dar alarme de piratas e corsários à vista.
Marquês de Rio Maior
(Jornal O Alcoa, de 21 de Agosto de 1947)