O foral de Alfeizerão de 1422 (Era de César de 1460) foi outorgado por D. Estêvão de Aguiar, abade do Mosteiro de Alcobaça.
Encontra-se na Torre do Tombo (Forais Antigos, nº339, maço 1, nº4). Henrique da Gama Barros publicou-o na "História da Admnistração Pública em Portugal nos séculos XIII a XV" (tomo VIII, pp. 121-124, Livraria Sá da Costa, Lisboa), omitindo apenas a parte das demarcações e confrontações do couto de Alfeizerão, que em quase tudo se assemelha ás descritas no foral de 1332 (e afirmamo-lo por consulta do original).
Em baixo entre duas imagens do foral, reproduzimos a transcrição que Henrique da Gama Barros fez do foral de 1422, incluindo os parêntesis inseridos pelo historiador e respeitando as suas opções paleográficas.
Em baixo entre duas imagens do foral, reproduzimos a transcrição que Henrique da Gama Barros fez do foral de 1422, incluindo os parêntesis inseridos pelo historiador e respeitando as suas opções paleográficas.
Quem tiver lido o primeiro foral de Alfeizerão, notará que este foral de 1422 é muito semelhante a ele, mas a sua função não era criar algo de novo, um novo foral, mas reafirmar e ratificar, num século de crise, os direitos e as rendas do Mosteiro, e a extensão dos seus domínios (que o Mosteiro procurou sempre alargar para as terras férteis e apetecíveis em volta).
Um dado ambíguo neste foral, é a sua data. O foral data de 1422, ano em que o rei D. João I, por decreto régio de 22 de Agosto, ordena que se substitua a Era de César (calendário Juliano) pela Era Cristã, a iniciar-se no ano (estimado) do nascimento de Cristo. Este foral é outorgado nesse mesmo ano, mas em Junho e se, na parte final, encontra-se escrito João Rodrigues a fez. era de mil quatrocentos e sessenta annos (1460 da Era de César, ano de 1422), no início do foral, encontra-se a data, errónea, do ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quatrocentos e quarenta.
Um dado ambíguo neste foral, é a sua data. O foral data de 1422, ano em que o rei D. João I, por decreto régio de 22 de Agosto, ordena que se substitua a Era de César (calendário Juliano) pela Era Cristã, a iniciar-se no ano (estimado) do nascimento de Cristo. Este foral é outorgado nesse mesmo ano, mas em Junho e se, na parte final, encontra-se escrito João Rodrigues a fez. era de mil quatrocentos e sessenta annos (1460 da Era de César, ano de 1422), no início do foral, encontra-se a data, errónea, do ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quatrocentos e quarenta.
CARTA DE FORAL DE 1422
«Em 28 de Junho de 1440, em Alfeizarão [«Alfeizarom»], lugar
e jurisdição do mosteiro d’Alcobaça à porta das casas onde mora Fernão Vasques,
procurador que ora é do dito lugar, estando ahi Estevam Vasques, ouvidor do
dito mosteiro e seus coutos por dom Estevam d’Aguiar, abbade do dito mosteiro,
do conselho d’el-rei e seu esmoler mór, e estando ahi outrossim Gonsalo Esteves
e Garcia Pires e João de S. Martinho, e Vicente Domingues o Conde e João Afonso
das Calças, homens bons do dito lugar de Alfeizarão, em presença de mim Pedro [falta
Alvares, como se mostra da
subscripção do instrumento], tabellião por el-rei, meu senhor, no julgado do
dito mosteiro e geral em todollos seus coutos e das testemunhas que ao deante
vão escriptas, o dito Fernão Vasques, procurador, apresentou ao dito ouvidor, e
a mim tabellião ler fez uma carta escripta em pergaminho, sellada de dois
sellos pedentes postos em fita «cardea» e branca, da qual carta o teor de verbo
a verbo é este q se segue.
« “In dey [sic]nominy
[sic] amen”. Saibam quantos esta carta virem que nós frei Fernando, abbade,
e o convento do mosteiro d’Alcobaça damos a vós povoadores d’Alfeizarão, e a todos
os vossos successores que depois vós vierem d’este dia pera todo sempre, as nossas
herdades d’esse lugar d’Alfeizarão e da Mota e da Torre de «fromendo», segundo
sam demarcadas per estas divisões que seguem [Vêm logo descritas as divisões, e
depois continua assim].
«Damos á vós sobreditos as ditas terras sob estas condições:
que vós lavredes e fruytifiquedes as ditas herdades bem e fielmente, e façades
vinhas e pomares e olivaes, e façaes hi marinhas de sal, e daredes a nós em
cada hum ano, pera todo sempre, a quarta parte de todo pão e legumes, e linhos
que Deus der em as ditas herdades, e outrossim do sal que ouverdes e mais nos
daredes a quarta parte de todo o que vos Deus der em as ditas vinhas e pomares
e olivaes, todo colheito e apanhado ás vossas despesas, posto em paz e a salvo,
a saber, o pão e legumes na eira e o linho no tendal, e o sal nas marinhas e o
vinho no lagar e a fruyta e hollivas aos pés das arvores, e todallas outras
cousas postas em os lugares acostumados, segundo melhor se usa per todo o nosso
couto, e mais nos daredes de cada uma «casarya» assim os moradores no lugar
como no termo, um bom alqueire de trigo «reçebomdo», na eira, de fogaça, e uma
boa gallinha «reçebonda» por S. Miguel de setembro, de foro; e os outros moradores
que não lavrarem herdade não dêem fogaça, mas dêem senhas boas gallinhas por o
dito dia; determinando todo em esta guisa, que quantos moradores fordes, que
tantas fogaças e gallinhas nos haveis de dar pela guisa que dito é; e se a mais
nos «erades» obrigados, fazemos-vos d’ellas merçê. E vos «deuees» «vymgar»
estas terras até tres annos, «merando as» e aproveitando-as continuadamente per
vós ou per outrem; e o que assim não fizer, seja em merçê de nós sobreditos de
l’ha tolher ou não; e vós nom «auedes» poder de vender essas herdades, nem
parte d’ellas, sem nollo fazerdes primeiramente a saber, e dando-vos lugar que
as vendaes, sejam vendidas a taes pessoas que nos pagem os nossos direitos e
façam o dito foro, e se o assim não fizerem, a venda não valha. E vós
sobreditos sereis sempre obrigados de nos dardes, cada um, sua carga de palha
pera nós quando a lá formos, ou para quem por nos estiver em ese castello, e se
volla não demandarem na eira não sejaes depois teúdos de a pagar. Item. Todos
os que viverem per almocrevaria devem nos fazer senhos caminhos cada um com sua
besta em cada um ano. E nós reservamos pera nós o nosso castello, que ora hi
esta situado, com todas suas moradas e entradas e sahidas e pertenças, segundo
melhor he devisado, e a terra, que foi vinha, que chamam «de pero neto» e a
horta assim como esta devisada. Item. Mais reservamos pera nós as saynhas que
som corregidas e adubadas per nós com todas suas entradas e sahidas e
pertenças. Item. Mais reservamos pera nós moinhos e açenhas feitas e por fazer,
pisões, lagares de vinho e d’azeite, fornos, relegos, açougagens, portagens, mordomado,
alcaidaria, e todos outros senhorios e direitos reaes per qualquer guisa que
sejam, tambem do mar e do rio como da terra, e o relego seja pollo costume de
Santarem. E vós deveis dar bem e fielmente e direitamente compridamente as
dizimas e primicias e conhecenças á Igreja. E vos enlegeredes vosso juiz por
dia de S. Miguel, apresentando-nollo, e nos juramentallo, e o alcaide seja
vizinho. E damos-vos medidas e pesos e foro de Santarem em todallas outras cousas.
E vos deveis pera sempre ser obrigados a abrir a vargea da mota, assim a aberta
de meos, como as sergentes, des contra os montes, e manterdellas á vossa custa;
e vos poherdes guardadores jurados que guardem os fruytos e novidades que Deus
der em essas terras e herdades, assignando aos damnadores que paguem coima
certas pollos damnos que fizerem com suas animareas, e os dannos que se fizerem
antre nos e vos devem-se de corriger de vizinho a vizinho segundo costume de
Santarem. E vos darees de lagaragem até S. çibraão tres soldos de boa moeda, do
dia e da noite, e dahi avante cinco soldos do dia e da noite, ainda que sejaes
muitos juntos em um; e nos vos devemos fazer lagares segundo cumprirem ao lugar
e não os fazendo, requerer nos hedes que os façamos até tres vezes, e de cada uma
vez haver espaço um mez e dahi em avante, não os fazendo, faça-se o que for
direito. E vos aveis de poher a apanhar o pam todos os de vossas casas; e se
mester for trazerdes alguns obreiros, paguem-se do monte maior antes que se
parta. Item. Damos-vos logar que possaes semear senhas teigas de cevada pera vossas
bestas e bois; e se d’ella venderdes ou colherdes, dardes-nos o nosso quarto.
Outrossim das favas, ervilhas .cebolas, alhos, fruitas, posades comer em verde
sem má malicia; e do que colherdes e emprestardes e venderdes, dardes-nos o
nosso quarto. E os nossos gados e os vossos devem paçer as hervas e beber as aguas
em sembra, em guisa que nom façam damno. E nos devemos tapar o nosso pomar em
guisa que seja bem tapado e se assim não for, posto que alli entrem alguns gados,
nom sejam teúdos a corregimento. E se vós sobreditos não fizerdes em o dito lugar
casas em que moredes, ou não as morardes, ou não aproveitardes as ditas terras
e herdades, fazendo hi vinhas e pomares e olivaes, ou não fizerdes as ditas
saynhas ou nom pagardes a nos sobreditos os nosos direitos e foros ou nom
cumprirem todallas clausulas e condições que ditas são, que nos por ello vos possamos
constranger como for achado que é direito. E nós, sobreditos povoadores e
lavradores, por nós e por todos nossos successores, louvamos e outorgamos a
cumprir e manter e guardar todallas clausulas e condições e cada uma d’ellas
como em esta carta som conteúdas nos obrigamos. A qual carta recebemos em nós,
e promettemos a ser bons vasallos e leaes á Ordem. Em testemunho das quaes
cousas nós, sobreditos abbade e convento, mandámos fazer duas cartas, ambas de
um teor, uma que fica registada em o livro da nossa notaria, e esta que mandamos
dar a vós sobreditos, sellada de nossos sellos pendentes. Dada em o dito nosso
mosteiro de Alcobaça, primeiro dia do mez de junho. João Rodrigues a fez. era
de mil quatrocentos e sessenta annos.
«A qual carta assim apresentada per o dito procurador,
presente os ditos homens bons, João Affonso, creado do dito senhor dom abade e
alcaide do castello, que hi de presente estava, disse ao dito ouvidor que
porquanto se o sobredito senhor dom Estevam d’Aguiar e seu mosteiro d’ella
entendiam de ajudar, que desse a mim sobredito tabelião, sua auctoridade, que
lhe desse um instrumento com o teor da dita carta sob meu signal, e o dito
ouvidor fez pergunta ao dito Fernão Vasques, procurador do dito concelho, e aos
ditos homens bons que hi estavam, se haviam algum embargo a lhe não mandar dar
o trallado da dita carta em publica forma, e eles disseram que não, e o dito
ouvidor, vista a dita carta como era boa e sã, não rota, nem cancellada, nem
antrelinhada, nem respançada, nem viciada, nem em nenhuma parte suspeita, mas
que era boa e verdadeira, deu a mim, tabelião, sua autoridade ordinaria que lhe
desse o instrumento ao dito João Affonso com o teor da dita carta, e o dito
João Affonso o pediu. Testemunhas. Estevam de coz, e Martim Anes Alcaide, e
João Affonso das Calças, e João Matheus, e Alvaro Vasques, moradores no dito
lugar d’Alfeizerão, e outros. E eu, Pedro Alvares, sobredito tabelião que este
instrumento escrevi, e em elle meu signal fiz que tal. Não seja duvida no
respançado hu diz e di avante cinco soldos do dia e da noute, que eu,
tabellião, a fiz por verdade e por correger em meu officio. Signal de tabelião.
Pagou nichil. Concertado com o ouvidor».
José Eduardo Lopes
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