quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Notas avulsas sobre os barcos e o porto de Alfeizerão - 1


 Portos flúvio-marítimos, progressivamente assoreados, na dependência do movimento das marés, da inconstância dos ventos e da frequência das travessias e das nortadas, não só educaram a atenção e as qualidades observadoras dos nautas, mas certamente concorreram para afinar e fixar o tipo da caravela, filiado no carib ou caravo dos árabes, mais apropriado a rios de pequeno fundo e de velame mais apto a colher variedades de ventos, ainda os mais escassos .
(Cortesão, Jaime, Os Descobrimentos Portugueses,volume I, Arcádia Editora, Lisboa, 1979).

Abstracto

     A atual enseada de S. Martinho do Porto, que prossegue o seu assoreamento e agonia num declínio de séculos apenas sustido (temporariamente) por dragagens, foi o cenário de uma antiga e vasta lagoa interior cujo perímetro navegável era acrescentado pela embocadura larga e funda da foz conjunta dos rios de Alfeizerão e Tornada, que a convertia num ancoradouro privilegiado para barcos de comércio e pesca. Abrindo para sul a Lagoa, esse esteiro largo deve ter-se prolongado em tempos anteriores à nacionalidade até à linha de colinas a sudeste de Alfeizerão, em cujas margens os romanos mantiveram um povoado (cidade?) cujas ruínas remanescentes se dispersavam pela zona conhecida como Ramalheiras.

     Nos primeiros tempos da nacionalidade, esse esteiro encontrar-se-ia certamente muito reduzido, mas com uma área e uma fundura suficientes para suportar a existência aí, até princípios do século XVII, de um duplo porto – o porto realengo de Salir e o porto alcobacense de Alfeizerão. Desse esteiro partiriam valas ou canais para o trânsito de naus e a construção naval [1], havendo a tradição literária de que uma dessas valas chegaria ao castelo ou à vila de Alfeizerão. Já em 1747, escrevia o padre Luís Cardoso no seu Dicionário Geográfico, que Alfeizerão foi porto de mar antigamente, de que ainda junto da vila existem vestígios de cais.

     Desse complexo portuário, os documentos indicam que o porto mais importante na lagoa era indubitavelmente o porto de Salir, que funcionava como um verdadeiro terminus oceânico para o comércio interno e externo, tendo o de Alfeizerão um papel quase subordinado a este, ainda que servindo ao mosteiro como um dos seus acessos vitais ao mar e ao comércio marítimo. Note-se que, tirando as marinhas de sal, os forais de Alfeizerão são típicos de uma comunidade rural - não existem disposições em letra de lei sobre o porto ou a construção de navios, parecendo serem suficientes as que se encontravam consagradas nos forais de Salir (mais adiante, veremos até que ponto) ou S. Martinho do Porto.

     O tempo de vida do porto de Alfeizerão findou antes de 1650, data em que por ordem régia se procede à abertura do rio de Alfeizerão. Alfeizerão manterá as marinhas de sal por mais de um século para além desta data, sendo ainda indicadas pelo pároco de Alfeizerão em 1758 (terão sobrevivido às grandes cheias de 1774, que revolveram e evisceraram as terras do vale?); enquanto o porto de Salir terá uma vida mais prolongada com o embarque e descarga de mercadorias na dita alfândega, por cuja posse terçarão requerimentos, sentenças e recursos o mosteiro de Alcobaça e o donatário da vila de Salir (primeiro, Afonso de Lencastre em finais do século XVI, depois o seu filho, Diniz de Lencastre). No século XVII, no entanto, a grande referência portuária na baía, era já e continuaria a ser o porto de São Martinho, que assumiu a importância comercial e náutica que era comum às três vilas portuárias. Não é, pois, de admirar, que o porto de São Martinho seja o único mencionado nas duas obras de Manuel de Brito Alão, que foi administrador e cronista da cercana Real Casa de Nossa Senhora da Nazaré no primeiro quartel do século XVII.

Alcobaça e o mar - generalidades

     Alfeizerão possuiu salinas, pelo menos, desde o século XIII, existindo referências expressas à extração de sal nos seus forais de 1332, 1442 e 1514. Esta atividade irá merecer-nos um texto dedicado, mas importa lembrar isso porque o Mosteiro de Alcobaça possuía inicialmente apenas três portos (Pederneira, Alfeizerão e S. Martinho), e o sal foi um dos primeiros produtos que o mosteiro exportou por um ou mais desses portos.

     A primeira referência a esse comércio chega-nos de uma obra religiosa, Os Milagres de S. Vicente dados a público em Lisboa por Mestre Estêvão, chantre da Sé Ulissiponense, obra hagiográfica em latim do primeiro quartel do século XIII que os especialistas julgam remontar ao século anterior. Um dos milagres atribuídos ao santo consiste no facto de um navio de Alcobaça ter escapado de naufrágio em perigo semelhante. Com efeito, o D. Abade que preside à comunidade dos monges, mandara encher um navio de carga com sal, que em Alcobaça há em abundância, e levá-lo para outro porto onde se compra mais caro (a transcrição desse milagre, traduzido do latim, é reproduzida em nota [2]).

     Este barco de Alcobaça (nauis Alkobacie), é um sinal claro de um comércio realizado pelo mosteiro de Alcobaça já nos seus primeiros tempos de vida, mosteiro que a partir de 8 de Junho de 1294 é autorizado por carta régia de D. Dinis a vender fora do país o seu vinho e o seu sal (se já não o fazia antes):
Dom Dinis pela graça de Deos Rey de Portugal, & do Algrave; a todos los Alcaides, & Almoxarifes, & a todolos outros, que guardam os portos do meu regno, saude. Sabede, que como quer eu eu defendesse que ninhuma couza non tirassem de minha terra pera fora de meu regno, por fazer merce ao Abbade, & convento do meu mosteyro Dalcobaça, mãdo que elles, ou aqueles a que elles o venderem,possam tirar da minha terra pera hu quizerem sem embargo ninhum, seu vinho, & seu sal: porque vos mando que lhis lo leixedes ende tirar como ditto he; & non nos embarguedes per rezão da dita defeza. Un al non façades, se nam a vos me tornaria eu per ende. E esse Abbade & Convento, ou outrem por elles tenha ende esta minha carta. Dada em Lisboa 8.dias de Junho, el Rey o mandou, Ayres Martins a fez, era 1332. 
(Frei Manuel dos Santos, Alcobaca Illustrada Noticias, E Historia Dos Mosteyros, & Monges insignes Cistercienses da Congregacam de Santa Maria de Alcobaca da Ordem de S. Bernardo nestes Reynos de Portugal, & Algarves, Primeira Parte, impresso na Oficina de Bento Seco Ferreira, Coimbra, 1710).
     O mesmo rei concedeu ao mosteiro por mercê do ano de 1284 que os homens moradores na povoação de S. Martinho de Salir (homines moratores in populam de sancto martino de sillir) pudessem ter três barcas de pescar sem pagarem quaisquer direitos à coroa (Direção Geral de Arquivos/TT, Chancelaria de D. Dinis, Livro 1, fl. 94); e três anos mais tarde, resgatou para a coroa a vila de Salir do Porto, comprando a três irmãos - Gonçalo, Estevão e Elvira Martins - os direitos em terra e no mar que detinham sobre ela (Iria Gonçalves e Manuela Santos Silva, obra citada) e, logo depois, estando alojado(s) em Alfeysarã, faz mercê à rainha D. Isabel dos direitos sobre os produtos que entravam no porto de Salir (Carta de 9 de Junho de 1287, que reproduzimos aqui). Salir do Porto será, a partir daí e com raras exceções, o porto das rainhas.

Alfeizerão e o mar – competências e cargos


     Ao ser nomeado um meirinho dos homens do mar para as vilas de Salir, Alfeizerão, Paredes e Pederneira, criou-se um litígio entre a coroa e o Mosteiro de Alcobaça no reinado de D. Afonso V, mas esse conflito tem a virtude de nos indicar os tipos de embarcações que então existiam nessas vilas portuárias: navjos, barcas, caravellas, batees (baixéis). O documento foi transcrito na íntegra e publicado por João Martins da Silva Marques (Descobrimentos Portugueses, volume I, Edição do Instituto para a Alta Cultura, Lisboa, 1949), mas reproduzimos o resumo que dele fez o cronista cisterciense Fr. Fortunato de S. Boaventura (Historia Chronologica e Crítica da Real Abbadia de Alcobaça, Impressão Régia, Lisboa, 1827):
     Em tempo del Rei D. Afonso V, o Almirante de Portugal mandou passar carta a Gil Afonso, por que o fazia Meirinho dos homens do mar da Pederneira, Paredes, Salir e Alfeizerão [da pedreneira e das paredes e de selljr e de alfeizeiram], para que ele pudesse dar os navios, barcas e caravelas {e baixéis] para o serviço del Rei, e pudesse prender os homens que não obedecessem. A isto se opôs o Abbade de Alcobaça dizendo que o Rei fundador do Mosteiro lhe dera toda a jurisdição cível e crime com mero e mixto império reservando pera si a alçada, em o qual tempo não havia Almirante nem muito tempo depois, e El Rei D. Dinis que fizera almirante nem os outros Reis seguintes se entremeterão nesta jurisdição, tanto que havendo seis anos que o Almirante posera na Pederneira hum Acensiannes por Juiz dos arraes e peitais deste Logo, houvera sobre isso tanta contenda que El Rei mandou que o dito Juiz não usasse de tal officio; e outrosi alegava o Abbade que em tempo del Rei D. Duarte, queixando-selhe o Abbade D. Estevão de Aguiar de ter passado huma carta a Gabriel Annes, criado do Infante D. Henrique, porque o fazia Alcaide dos Pescadores e homens do mar dos Lugares da Pederneira e Paredes, o dito Rei revogou seu mandado e conservou ao Mosteiro em seus privilégios: o que visto e outras cousas que se alegaram, ElRei D. Afonso deu sentença pelo Mosteiro em Lisboa a seis de Agosto de 1460. ElRei o mandou por Nuno Gonçalves, Doutor em Leys, Cavalleiro de sua Caza do seu Desembargo e Juiz de seus Feitos.
     No porto de Salir, o oficial que procedia à cobrança da dízima do pescado ou à portagem pelos produtos entrados ou saídos na barra era, segundo o foral manuelino da vila, o oficial da alfândega, sujeito ao almoxarife de Óbidos. Do lado de Alfeizerão, deveria existir um oficial com idênticas atribuições, mas subordinado ao alcaide-mor de Alfeizerão. Para o século XV existem diversos documentos que retratam o alcaide-mor de Alfeizerão nas suas funções de cobrador da dízima pelo peixe que se pescava na lagoa ou era pescado fora dela pelos pescadores que moravam nas suas margens, assinalando-se aqui o registo excecional (ou de uma pescaria excecional) de uma dízima cobrada no ano de 1440 pelo alcaide de Alfeizerão, João Afonso, a pescadores de S. Martinho no montante de cinco milheiros de sardinha (Livro de Privilégios, Jurisdições, Sentenças, Igrejas deste Real Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça). Esse ofício de cobrança das dízimas do peixe podia ser emprazado pelo mosteiro, como o foi no ano de 1461 à pessoa de Diogo Botelho da Silveira (Livro dos Privilégios…), que foi também alcaide-mor de Alfeizerão.

     Ordinariamente, e isso é nítido nos forais da Pederneira e de Salir do Porto, incidiam sobre os pescados uma dízima velha e uma dízima nova, a primeira tributação revertia para a igreja de que os pescadores eram fregueses, e a segunda para o rei ou para o donatário da terra; tendo esta última sido fixada no reinado de D. João I (pelo contrato dos mareantes que se indica no foral de Salir). Esta situação permite compreender que o vigário de Alfeizerão e S. Martinho tivesse direito à dízima do peixe salgado que entrava em S. Martinho (em rigor, a dízima velha), com alguns exemplos que se podem apontar para os séculos XVI e XVII (Livro dos Privilégios…).

     No foral manuelino da vila de Salir, retoma-se o foral concedido pela rainha D. Leonor (Foral do lugar de Sellir da Foz pella Rainha Dona Lianor), introduzindo algumas modificações e salvaguardas num segundo diploma, o Foral de Sellir da Foz. No primeiro, estão exaradas as condições especiais de que beneficiava o porto de Alfeizerão e os restantes lugares do Mosteiro. Reproduzimos esse trecho do foral da transcrição integral realizada por Fernando Luís Carvalho Dias:
     E por quanto as cousas que vaão do dito lugar de Sellir aportar em Alfeyzerão e na terra do mosteiro dalcobaça se nom guardam as leis e determinações nestes casos seguintes. Ouvemos por bem de nom somente as mandarmos poer no próprio foral da Ordem […de Alcobaça – alguma adenda ao foral de Alfeizerão?] mas aInda neste lugar as decrarar por que a todos fosse sabido da maneira que Se ham de cumprir.
     Primeyramente decraramos que de quaes quer mercadorias e cousas que vierem per terra ou per aguaa da terra do dito moesteiro pera se averem de dembarcar e carregar pera fora da barra no dito porto de Sellir nom se pagará nenhum direito na dita terra da ordem por respeito da sacada e sayda e passagem de foz ou de barra. Nem menos levarão seus ofiçiaaes dos navyos nenhum dinheiro nem direito dos despachos das ditas cousas por lhe nom pertencer. Por quanto ho direito da entrada e sayda da dita barra hé em Sollidum apropriada aos direitos de Sellir.
     E somente se paguarão das ditas mercadorias e cousas que assy da dita terra da hordem vierem pera o dito porto aquelle preço somente que a cada huma das ditas cousas for imposto na dita terra de portagem de compra e venda per seu foral novamente per nós feyto. E isto comprandosse na dita terra. Por que vindo de fora e passando pera qual quer terra sua ainda que embarquem per aguoa pera vir ao dito Lugar de Sellir, nom se paguará nenhum direito de nenhuma sorte.
     E assy decraramos que de quaes quer mercadorias e cousas que sayrem do dito lugar de Sellir pero ho dito lugar dalfeyzeram ou pera quall quer outro lugar da dita ordem se nom leve mais outra dizima nem portagem nem passagem nem outro nenhum direito por assy sayrem em sua terra assy per aguoa como per terra de nenhuuma sorte e calidade que as mercadorias possam seer. Sallvo daquelas que em sua terra se venderem. Das quaes se pagará somente  aquelle direito de portagem que pollo foral de tal lugar hy mandarmos especificadamente pagar.
 
     (Foral do lugar de Sellir da Foz pella Rainha Dona Lianor , in DIAS, Luís Fernando Carvalho Forais manuelinos do reino de Portugal e do Algarve: conforme o exemplar do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Tomo 3 - Estremadura, edição do autor, Beja, 1962).
     Este foral de Salir parece indicar a existência de uma cópia (desaparecida) destas disposições apensa ao foral de Alfeizerão, e presumivelmente ao exemplar que era conservado, por norma, no concelho. Em todo o caso, as queixas a Fernão de Pina pelas situações dúbias deste foral de D. Leonor levam à redação do mencionado Foral de Sellir da Foz, do qual também respigamos uma parte:
     E por quanto os moradores e pescadores de sallir e dos outros lugares se agravam que sendo todollos direitos Reaaes daquella emtrada do mar de sallir e lá se pagar delles seu direito assy Aa entrada como aa saida que tambem lhos Requeriam outra vez quando vinham aportar em alfeizaram com as cousas de que assy Já pagaram seu direito. E por tanto decraramos que de quaaes quer mercadorias e cousas de que se pagar ho direito por emtrada em sallir que nom paguem mais outro direito em alfeizaram as pessoas que ho tal direito pagarem por via de sacada em terra do moesteiro ou emtrada.    
     Porem se as venderem no dito lugar dalfeizaram ou em alguum outro lugar do dito moesteiro pagaram dellas ho direito da venda da portagem segundo ho que das taaes cousas se mandar pagar portagem per este foral sem mais outra emnovaçam nem acreçentamento posto que doutra maneira se ora requeresse ou levasse ho que avemos por bem que se mais nom faça.
 
(Foral de Sellir da Foz, in DIAS, Luís Fernando Carvalho Forais manuelinos do reino de Portugal e do Algarve: conforme o exemplar do Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Tomo 3 - Estremadura, edição do autor, Beja, 1962).





Adendas:

[1] 
A lagoa de Alfeizerão adentrava-se até à vila que lhe dava o nome, desdobrava-se em braços, até próximo da granja da Mota, para outras direções mais. À volta dessa lagoa, hoje reduzida à concha de S. Martinho, desenvolveu-se um complexo portuário da maior importância, representada pelas três povoações em análise. Por elas se escoavam e aí se faziam chegar produtos, aí se pescava, se extraía sal, se construíam embarcações. (GONÇALVES, Iria; e SILVA, Manuela Santos, São Martinho do Porto e a Lagoa de Alfeizerão na Idade Média, in A Baía de S. Martinho do Porto – Aspectos Geográficos e Históricos, Edições Colibri/Associação de Defesa do Ambiente de São Martinho do Porto, Lisboa, 2005)

[2] 
Milagres de S. Vicente dados a público em Lisboa por Mestre Estêvão, chantre da Sé Ulissiponense

Há-de atribuir-se certamente aos merecimentos do glorioso mártir o facto de um navio de Alcobaça ter escapado de naufrágio em perigo semelhante. Com efeito, o D. Abade que preside à comunidade dos monges, mandara encher um navio de carga com sal, que em Alcobaça há em abundância, e levá-lo para outro porto onde se compra mais caro. Saíra, pois, o navio com vento favorável, mas enganoso, do porto, e quando singra no alto, um pouco longe da terra, de repente, sobrevêm uma forte ventania contrária à posição das velas e num turbilhão atinge e envolve de tal modo o navio que com a corrente temerosa das ondas o navio é atirado para os buracos dos rochedos e para os sítios de onde ninguém sairia porque cairia a pique. E então que os homens de religião que ali se encontravam, aterrados com o perigo iminente, erguem em uníssono um clamor e dirigem preces incessantes a S. Vicente e soltam altos brados para que os livre da morte que os espera. Como por encanto, ao acabarem a oração, a borrasca passa, o vento converte-se em brisa agradabilíssima e o navio dirige-se com toda a tranquilidade para o porto em que o bem-aventurado Vicente é venerado. Logo que se sentem livres de tanto perigo apressam-se a ir à presença do santo mártir e aí rendem múltiplas graças pela libertação do perigo e dão a conhecer ao povo, em palavras que traduzem a sua gratidão, como haviam ficado livres de uma morte iminente por seus méritos.
(Reproduzido de: S. Vicente de Lisboa e seus milagres medievais, de NASCIMENTO, Aires Augusto, e GOMES, Saúl António, Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 1985. Versão eletrónica em: http://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/15163/1/V01501-073-159.pdf)


sábado, 19 de setembro de 2015

A construção de barcos em Alfeizerão - uma citação e uma pesquisa



     A citação da sinopse no portal da Torre do Tombo de uma carta para O CONCELHO DE ALFEIZERÃO, CONFIRMAÇÃO DE UMA CARTA DE D. JOÃO II, DADA EM TORRES VEDRAS, A 21 DE AGOSTO DE 1493 E ESCRITA POR JORGE AFONSO, NA QUAL CONFIRMAVA OUTRA DE D. AFONSO V, DATADA DE SANTARÉM, 8 DE DEZEMBRO DE 1457, E ESCRITA POR ÁLVARO GIL.

     Esta carta (cuja cota é: Chancelaria de D. Manuel I, liv. 40, fl. 9) é de inegável interesse, porque nos mostra, não apenas que se construíam navios ou frotas (fótias) em Alfeizerão, mas porque revela também o modo como esse labor envolvia toda a comunidade.

     O resumo do documento, na dita página Web, diz-nos o seguinte:

     Nesta [Carta], tendo os juizes, vereadores, procurador e homens bons do concelho de Alfeizerão, e Diogo da Silva, do conselho del-rei, e Escrivão da Puridade, recontado que de 2 anos até então se haviam aí feito 4 navios para a armada que el-rei [D'El-Rei ?], no que os moradores recebiam grande trabalho e fadiga por pousarem com eles os Senhores dos navios, e, às vezes, os seus homens que aí vinham para dar aviamento às "fótias" deles, e bem assim os carpinteiros e calafates que, nesses 2 anos, continuadamente, nunca deixaram de obrar. E assim os "fragueiros" * que vinham cortar os liames dos navios. E como os lavradores acarretavam com seus bois e carros as madeiras para eles, assim em lhes levarem mantimentos, e embora por seus jornais fossem pagos, não deixava de ser grande perda em suas fazendas. E sendo o lugar tão próximo da estrada, não podiam dar mantimentos e pousadas, como lhes convinha, aos caminhantes que por aí passavam, por causa do sobredito trabalho Pedindo o privilégio e liberdade de não serem constrangidos a levarem mantimentos a outras partes, nem servirem com suas bestas, el-rei, pela boa informação que tinha da gente desse lugar, houve por bem que, de então em diante, não fossem nisso constrangidos. Vicente Pires a fez.


     * Fraga, que no comum associamos a rochas, fráguas (monte fragoso), tem aqui o significado menos disseminado de madeira, mata, brenha. António de Moraes Silva (Diccionário da Lingua Portugueza, Tomo II, Lisboa, 1813) diz que fraga significa o tosco e grosseiro da lenha que se desbasta.
     Nas matas, andavam os fragueiros a cortar os liames, que não eram cabos nem cordas, noção a que de ordinário chegamos por associação de ideias, mas a madeira das curvas, com que se ligam e atam as peças do costado dos navios (António de Moraes Silva, obra citada).


O rio e o porto de ALFISARON

     Jaime Cortesão, na sua obra Os factores Democráticos na Formação de Portugal (Portugália Editora, 1964) refere uma obra náutica italiana *, o Portolano de Bernardino Rizzo, onde se refere, entre outros, os portos da Pederneira (Perdarerna) e Alfeizerão (Alfisaron), descrevendo sobre este aquilo que parecia ser, nas palavras de Cortesão, uma grande atividade de construção naval. Jaime Cortesão baseara-se num estudo do sábio alemão Conrad Kretschmer (Die italienischen Portolane des Mittelahers, Berlim, 1909) e desconhecemos, ainda que suspeitemos do contrário, se chegou a consultar a obra original de Bernardino Rizzo.

     O Portolano per tutti i naveganti é um roteiro náutico publicado em Veneza em 1490 por Bernardino Rizzo da Novaria, Stampador (impressor), cuja autoria é atribuída ao navegador veneziano Luigi Cadamosto, que explorou as ilhas Canárias e as costas africanas ao serviço de Portugal e do Infante D. Henrique. A obra publicada por Rizzo, encontra-se digitalizada e disponível online.

     Aproveitando essas facilidades, escrutinamos o Portolano em busca da passagem que nos interessava sobre a Pederneira e Alfeizerão. Na página 39 do PDF, o portulano fala dos portos da costa portuguesa e nomeia, entre a Galiza e Lisboa (continuando depois para Sul), os lugares de Viana, Vila do Conde, Porto e Gaia (Portogallo), Aveiro, Mondego (a Figueira ou outros dos portos desse rio), Berlengas, Pederneira, Alfeizerão, Cabo Carvoeiro, Cabo da Roca e Lisboa

O "nosso" parágrafo, que transcrevemos de seguida, é este:


De madego al chavo cbarboner e uno logo a nome perdarerna e uno altro luogo a nome el fiume alfisaron chee porto de marea e qui se sano de molte nave e navili per esser di Boschi asai
     Cientes das nossas muitas limitações no que toca ao italiano e, sobretudo, ao italiano falado corrente no século XV, recorremos a um amigo nosso, o italiano Stefano Valente, que além de escrever ficção e ensaios **, é também glotólogo e tem realizado inumeráveis trabalhos de tradução de textos do e para o italiano.

     Com a sua ajuda (que aqui, encarecidamente, agradecemos), chegamos à seguinte tradução:
Do Mondego ao Cabo Carvoeiro há um lugar de nome Pederneira e um outro lugar do nome do rio Alfeizerão, que é porto de maré e onde se sabe de muitos navios e frotas para serem carregados de madeira.
     Inicialmente, nave e navili sugeria-me naus e embarcações mais pequenas, como as galés. mas Stefano Valente assinala que, e cito: A palavra «navili» (agora navigli) significa «pequeno navio» mas - sobretudo em italiano antigo - assinalava especificamente um «conjunto de navios», uma frota de naus que viajavam juntas por um certo objetivo (comercial, militar etc.). Escreve o florentino Giovanni Villani (ca. 1280-1348): "Il rimanente delle galee e tutto il NAVILE de' Pisani si partirono di Sardigna" (Cronica).

     Se a nossa interpretação estiver correta, o Portolano de Rizzo parece assinalar o embarque pelo porto de Alfeizerão das madeiras das matas do mosteiro, atividade económica amplamente confirmada pelas fontes documentais.





*   Também folheamos um outro roteiro náutico, este francês e do ano 1590, Le Grand Routier (Le grand routier et pilotage et enseignement pour ancrer tant ès ports, havres qu'autres lieux de la mer), mas os únicos lugares costeiros do centro que são aí apontados são o porto de Paredes e as Berlengas. A obra, escrita por Pierre Garcie, dito Ferrande, lista, na página 21 os lugares de referência na costa portuguesa com as distância entre eles expressas em léguas marítimas: De Bayonne a Caminha, 4 léguas; de Caminha a Viana, 4 léguas, de Viana a Vila do Conde, 5 léguas; da Vila do Conde ao Porto em Portugal [sic], 4 léguas; do Porto a Verride [Vero de Mondego], 9 léguas; do Mondego a Paredes [Parades], 9 léguas; das Paredes às Berlengas [Berlingues], 9 léguas; das Berlengas ao Cabo da Roca [Rocque de Cyntre], 12 léguas; do Cabo da Roca ao Cabo Espichel [cap de Fichiet], 10 léguas; do Cabo Espichel ao Cabo de S. Vicente, 28 léguas.

** A única das suas obras que foi, até agora, publicada no mercado nacional, foi o romance O Espelho de Orfeu, pela Ésquilo Editora.


domingo, 30 de agosto de 2015

O dinossauro de Alfeizerão

Um Dacentrurus armatus, o primo forte do dinossauro encontrado em Alfeizerão


1 - Mundo Jurássico

     A zona de Alfeizerão inscreve-se no bordo da Bacia Lusitaniana, numa região delimitada a norte pela falha da Nazaré, e a sul pela falha de Torres Vedras, e e que é caraterizada pela designada Depressão ou Diapiro de Caldas da Rainha, uma dobra associada a uma falha que se traduziu pela intrusão de uma camada geológica mais antiga (as Margas da Dagorda) - esse diapirismo acentuou-se no período Jurássico com a formação de sub-bacias.
Os afloramentos da unidade de Margas da Dagorda, mais resistente que os materiais envolventes, constituem os relevos destacados na baixa de Alfeizerão. Um destes relevos é constituído pelo local de implantação do castelo. A transição abrupta da zona baixa para as encostas a nascente, as quais correspondem ao bordo leste do Diapiro de Caldas da Rainha, é feita por uma falha que coloca em contato duas unidades com diferente natureza e idade. A primeira, constituída pelas Margas da Dagorda, de cor arroxeada, visível nos taludes da autoestrada, contata com a segunda, formada por um complexo estratificado de grés e margas do Jurássico Superior.
(INÁCIO, Ana, Uma região de contrastes, artigo no fascículo Alfeizerão, do jornal Região de Cister, ano de 2014).
     Alfeizerão ocupa o fundo do Diapiro de Caldas da Rainha, assentando numa planície aluvial relativamente recente; e as suas colinas a oriente preservam estratos geológicos do Mesozóico, com conchas fósseis e vestígios de plantas e animais.

Um mapa geológico da região, onde o cinza-claro corresponde ao Jurássico Superior, o cinza-escuro ao Triásico Superior e Jurássico Inferior, e o branco a rochas de outros períodos geológicos. Nota-se a oposição das duas unidades geológicas distintas na linha de colinas a nascente de Alfeizerão. Mapa retirado, com a devida vénia, do estudo Natural to anthropogenic forcing in the Holocene evolution of three coastal lagoons (Caldas da Rainha valley, western Portugal) , de J.L. DINIS, , V. HENRIQUES , M.C. FREITAS , C. ANDRADE , P. COSTA, documento eletrónico de 13 de Março de 2006, disponível no endereço: https://estudogeral.sib.uc.pt/jspui/bitstream/10316/3937/1/file6547c54cc10c481d8b9ee880521d3e73.pdf


2 - Paul Choffat

     Paul Choffat, nascido na Suíça em 1849, foi instado pelo seu pai a seguir uma profissão fiável e segura, pelo que começou por se empregar numa casa bancária com dezanove anos; e a prosperidade alcançada nessa carreira, aliada a uma paixão crescente pela ciência, impeliram-no a seguir em Zurique o curso de Química e de Ciências Naturais, que concluiu com distinção, numa altura em que já se entregava a estudos em paleontologia, sendo depois nomeado professor agregado de paleontologia animal na Universidade e Escola Politécnica Federal de Zurique. Trabalhou com os maiores geólogos do seu tempo, notabilizando-se no estudo dos estratos jurássicos do Jura francês. Em 1878, em Paris, no decorrer dos trabalhos do Congresso Internacional de Geologia, Choffat foi convidado a trabalhar em Portugal por Carlos Ribeiro, distinto geólogo e diretor da Secção dos Trabalhos Geológicos de Portugal, organismo que antecedeu os Serviços Geológicos de Portugal. Choffat chega ao nosso país nesse mesmo ano, para um período de tempo de trabalho que estimava em três meses, mas os seus estudos e trabalhos no nosso país estenderam-se por quatro décadas, publicando inúmeros trabalhos científicos de geologia e cartografia geológica.

3 - Os achados na mina de carvão

     Em 1908, Paul Choffat desloca-se a Alfeizerão para explorar os vestígios de fósseis postos a descoberto numa mina de carvão próxima da vila. A localização da mina é descrita desta forma: A mina encontra-se a cerca de quilómetro e meio a Este da igreja de Alfeizerão, e a sua entrada abre-se numa ravina que emerge da planície imediatamente a sul da curva que marca o início da estrada que sobe para Alcobaça.

     Indaguei sobre essa mina, e o Carlos Casimiro de Almeida deu-me as indicações para a sua localização, adiantando, no entanto, que a boca ou entrada da mina ainda era nítida há quarenta ou cinquenta anos, mas que já não existiam traços visíveis da sua existência. Segui essas indicações numa deslocação ao lugar. Quem saia de Alfeizerão na direção da A8 pela estrada nacional 242, encontrará antes da rotunda uma saída à direita que passa por baixo do viaduto e descreve um U antes de começar a subir para a Cadarroeira. Essa estrada alcatroada, que surge nos mapas como Caminho do Vale do Moinho, tem à esquerda, ainda cá em baixo, um caminho largo em terra que sobe para os lados do Casal Pardo (um belo passeio, por sinal), e era na encosta a montante desse caminho que as pessoas de Alfeizerão se lembravam da existência da boca da mina. A vegetação cobre a encosta quase por completo, tornando extremamente difícil averiguar da sobrevivência dessa entrada.

     Paul Choffat realizou no local um corte transversal que expôs as seguintes camadas geológicas: no topo, uma camada de areia do período Kimmeridgiano, seguindo-se a esta uma camada do Jurássico com carvão fóssil ou lignito e diversos ossos de um mesmo dinossauro, encontrados junto a um ovo de dinossauro; depois, uma camada de argilas com vestígios vegetais (de fetos e coníferas) e, por fim, uma camada de calcário do Lusitaniano com crinóides e ouriços-do-mar.

     O dinossauro encontrado era um Dacentrurus lennieri (que no tempo de Choffat ainda se designava pelo nome de Omosaurus lennieri) um dinossauro herbívoro da família dos estegossauros (Ordem: Ornitischia, Infraordem: Stegosauria) de corpo resguardado por placas e aguilhões. Os Dacentrurus subdividiam-se em dois tipos diferentes, este, o Lennieri, grácil e de menores dimensões, e o Dacentrurus armatus, maior e mais robusto.

     Os ossos fósseis encontrados na mina, que se supõe pertencerem ao mesmo indivíduo, eram formados por duas vértebras dorsais, seis vértebras da cauda, e diversos fragmentos das costelas.

     O ovo de dinossauro, ou metade de um ovo de dinossauro, encontrado junto a estes ossos fossilizados, tornaram célebre este trabalho de Choffat porque, em princípio, estaríamos perante o primeiro exemplo de um ovo de dinossauro encontrado no nosso país. Os progressos da paleontologia determinaram, no entanto, que fora retirado da mina, não um ovo, mas um pseudo-fóssil, uma formação rochosa de origem não-orgânica que conseguiu enganar o experiente geólogo suíço (segundo Karl Hirsch, referido por E. G. CRESPO, em Dinossauros do Jurássico Médio e Superior Português, publicação eletrónica disponível no endereço http://www.arca.museus.ul.pt/ArcaSite/obj/pubsZoo/MNHNL-0001293-MB-DOC-web.PDF, consultado pela última vez em 30 de Agosto de 2015).

4 - Algumas achegas

     Os dados que aqui trouxemos sobre o dinossauro de Alfeizerão foram colhidos na obra de referência sobre dinossauros no nosso país, escrita por LAPPARENT, A. F. de, e G. ZBYSZEWSKI (Les dinosauriens du Portugal. Mémoires des Services Géologiques du Portugal, nouvelle série, 2:1-63, 1957).

     A mesma obra assinala o achado de três vértebras quebradas de Megalosaurus insignis na parte superior de uma arriba marinha a nordeste de Salir do Porto, na superfície de um banco calcário cortado por pequenas falhas. O Megalosaurus insignis era um dinossauro carnívoro de grandes dimensões do período Jurássico Médio. Um achado a juntar aos iconofósseis (pegadas de dinossauro) que enxameiam as rochas da serra do Bouro.

     Na mesma obra ficamos a saber que, da espécie de dinossauro encontrada em Alfeizerão, o Dacentrurus lennieri, foram descobertos exemplares no Jurássico Superior da Atalaia (Lourinhã), S. Bernardino (Peniche), Murteiras (Foz do Arelho), Praia da Areia Branca, Maceira e Pombal; enquanto o Dacentrurus armatus foi exumado no Baleal, Murteiras (Foz do Arelho), Lourinhã e Sesimbra. 

     Galton, referido por E. G. Crespo (obra citada, página 52), defende que nunca existiu um tipo Dacentrurus lennieri, e o que se classifica como tal são indivíduos jovens (logo mais pequenos e leves) do Dacentrurus armatus.


domingo, 9 de agosto de 2015

LIVRO DE PRIVILÉGIOS, JURISDIÇÕES, SENTENÇAS... - 2

LIVRO DE PRIVILÉGIOS, JURISDIÇÕES, SENTENÇAS, IGREJAS
DESTE REAL MOSTEIRO DE SANTA MARIA DE ALCOBAÇA
(Direção Geral de Arquivos/TT, Ordem de Cister,
Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, liv. 92). 
Detalhe do «Livro das Fortalezas Situadas no Extremo de Portugal e Castela por DUARTE DE ARMAS, Escudeiro da Casa do Rei D. Manuel I», fólio 111 (Direção Geral de Arquivos/TT, Códices e documentos de proveniência desconhecida, n.º 159)

Dízima do Mar
S. Martinho
[Fólio 34, Img 42]
El Rei D. Diniz, na Era de 1322, que é o ano de Cristo de 1284, fez graça e mercê ao Dom Abade e convento de Alcobaça, que os homens de S- Martinho de Salir [«S. Martinho de Selir»] tenham três barcas de pescar, e delas não paguem ao dito rei nenhum foro (Livro 6.º dos Dourados, fl. 125).
Na Era de 1412, que é o ano de Cristo de 1374, a rainha D. Leonor mandou aos seus almoxarifes de Óbidos que não impedissem ao Mosteiro de levar a dízima dos navios que aportassem da banda de S. Martinho segundo a sua posse; e se alguma coisa lhe tinham levado, lho restituíssem, e isto em sua vida dela; e depois ficasse o direito salvo aos reis e rainhas, e ao Mosteiro em razão de sua posse e propriedade (Livro 6º Dourados, fl. 125).
No ano de 1424, o abade D. Fernando arrendou uma barca nova [em S. Martinho] a Fernandes Anes Gago e a Vicente Redondo (Liv. 6 D., fl. 125v.º).
No ano de 1426, pretenderam os rendeiros do Infante cobrar os direitos de um pescador, a saber, a dízima de pescado, de que foi absoluto (Liv. 6º D., fl. 126).
No ano de 1429, mandou a Infanta ao seu Almoxarife de Óbidos que o direito da barca e portagem que tinham tomado da barca de S. Martinho, entregassem logo ao Abade e Convento de Alcobaça, e lho deixem haver assim como até aí houveram, ficando a ela resguardado algum direito se depois o houvesse (Liv. 6º D., fl. 126 v.º).
No ano de 1440, recebeu João Afonso, alcaide de Alfeizerão, em nome do Mosteiro, a dízima de cinco milheiros de sardinha (Liv. 6º D., fl. 128 v-º) [1].
A 12 de Dezembro do ano de 1442, pagaram Álvaro Pires [?] e Martim Vasques, pescadores, a este Mosteiro, a dízima da sardinha que pescaram no porto de S. Martinho. Pelo Instrumento do Liv. 6º dos Dourados, fl. 128 v.º.
A 28 de Março de 1443 mandou El Rei D. Afonso V emprazar a João Afonso, Monteiro [?} e Alcaide de Alfeizerão, e a Diogo Afonso, escrivão do Mosteiro, e ao padre celeireiro, para que em nove dias [com]parecessem na Corte por certa sardinha que tomaram por força a Martim Vasques e Martim Anes, pescadores da Pederneira; e com efeito foram notificados em 8 de Maio do dito ano (Livro 6º dos Dourados, fl. 127). Por virtude do dito emprazamento, foi o D. Abade à Corte requerer sua justiça a El Rei, e apresentando-lhe seus títulos e posse, o qual, informado de tudo, declarou que ao Mosteiro pertenciam as dízimas dos pescadores, assim de S. Martinho, como de fora que aí aportassem, e mandou que os almoxarifes de Óbidos entregassem os batéis que tinham tomado aos pescadores, e entregassem ao Mosteiro as rendas de Torres Vedras, que por esse motivo lhes eram sequestradas (Livro 6 D., fl. 127, ano de 1443).
No ano de 1443 ficou Garcia Pires de Alfeizerão por fiador de Afonso de Panjam, para pagar por ele a dízima de um navio de sal que carregou em Alfeizerão (Liv. 6 dos D., fl. 127 v.º).
No ano de 1461, emprazou o Mosteiro a Diogo da Silveira os dízimos do porto de S. Martinho (Prazos Avulsos, n.º 178).
No ano de 1493, se fez a demarcação das terras dos coutos com as de Salir do Porto e Óbidos, e se declarou por sentença ser a divisão pela foz de Salir, e daí pelo rio acima, como consta do Instrumento no Livro 2 de Sentenças, fl. 59; e Lº 3, fl. 29, e Lº 26, fl. 73.
O mesmo se julgou no ano de 1568 contra o comendador-mor D. Afonso de Lencastre , Donatário de Salir do Porto (Livro 27 de Sentenças, fl. 46).
O mesmo consta da Demarcação que se fez no ano de 1696 (Livro 22 de Sentenças, fl. 754, e Livro 23, fl. 325).
No ano de 1515, saiu uma baleia na costa de S. Martinho, a qual o D. Abade mandou arrecadar por lhe pertencer tudo o que sai nas costas da terra dos coutos, e estar nessa posse, como diz o Instrumento no Livro 6.º dos Dourados, fl. 131.
Estando o Mosteiro pelo modo referido na posse de levar, e haver as dízimas, assim do pescado, como das mercadorias que entravam pela foz de S. Martinho, quieta e pacificamente, sucedeu que no Foral Novo que no ano de 1515 deu El Rei D. Manuel à vila de Salir do Porto, carregou para lá todos os ditos direitos, e o Mosteiro foi privado da sua posse. Pelo que intentou o Mosteiro demanda por eles, e afinal se julgou na Coroa que os direitos das fazendas que entravam pela foz de Salir eram comuns entre o Mosteiro e a rainha, e assim se disse cumprirem a ambos os forais. Esta sentença foi dada no ano de 1551, e anda junto aos Autos que correm com a Senhora Rainha. Apresentando-se a dita sentença ao Juiz de Salir do Porto, que por ela dar posse ao Mosteiro de metade dos ditos direitos, ele o não quis fazer, dizendo que lhe não tocava; de que se agravou por parte do Mosteiro e teve provimento no ano de 1560 (Livro 2 de Sentenças, fl. 45). E em virtude dela se tomou posse da dita metade (id. fl. 48).
Depois disto, D. Afonso de Lencastre, Comendador-mor e donatário da dita vila de Salir do Porto, violentamente e por força, esbulhou [despojou] o Mosteiro da dita posse, de que resultou passar El Rei uma provisão no ano de 1564 para o desembargador Diogo Lopes Pinheiro restituir ao Mosteiro a sua posse, como restituiu pelo Instrumento no Livro 2 de Sentenças, fl. 51. No ano de 1565, passou El Rei outra Provisão para o corregedor de Tomar fazer entregar ao Mosteiro a posse dos ditos direitos, a saber, metade deles em execução da dita sentença, citando para isso o Comendador-mor, e que tendo ele embargados, fossem remetidos aos Desembargadores do Paço, e sendo com efeito citado à sua revelia, se deu a posse ao Mosteiro pelo Instrumento no Livro 2 de Sentenças, fl. 88. Da dita execução, e posse, agravou o Comendador-mor confusamente [«confundamente»] que a dita sentença não fora dada contra ele, nem por ela fora citado, nem ouvido, estando na posse dos ditos direitos, e assim se não podia executar contra ele. Com efeito, foi provido no agravo, e se mandou que fosse restituído à sua posse, e que ao Mosteiro ficasse o direito reservado, para haver os ditos direitos pela via ordinária, como consta no dito Livro 2.º, fl. 76. E por virtude dela tornou o Comendador-mor a entrar na posse, pelo Instrumento a fl. 84. E por este modo, tudo o que até aqui se fez, ficou em nada.
Depois disso se impetrou [requereu] por parte do Mosteiro, um alvará D’El Rei, pelo qual mandou que os Desembargadores da Casa de Supliciação, ouvindo o Comendador-mor sumariamente, despachassem de novo aquela contenda pelo merecimento dos autos velhos que haviam corrido entre o Mosteiro e o Procurador D’El Rei e da Rainha, e por falecimento do Comendador-mor D. Afonso de Lencastre, se habilitou seu filho, D. Diniz, e no ano de 1578, se proferiu sentença a favor do Mosteiro, pela qual se julgou pertencerem ao Mosteiro todos os direitos daquilo que entrava pela foz de Salir. Esta sentença se tirou do Livro 2 delas, e se juntou ao feito que agora corre com a Senhora Rainha. A dita sentença se pôs em execução diante do Corregedor do Cível da Corte, que fez citar o dito Comendador-mor para dentro de dez dias largar a posse, e alegar o que tivesse. E por não o fazer, se passou Carta de posse que anda no Livro 2.º de Sentenças, fl. 99. E por ela tomou posse de tudo (fls. 105 e 106). E daí em diante ficou o Mosteiro em posse pacífica de cobrar todas as dízimas das mercadorias e do pescado que entrava pela foz de Salir sem nenhuma contradição.
E porque esta renda ficou na repartição do Cardeal Comendatário Infante D. Henrique quando se separaram entre ele e o Convento, e por isso, em 2 de Junho de 1579, tempo em que já era rei, largou ao Mosteiro, e fez dele a metade dos frutos secos que viessem do Algarve aos portos da Pederneira e S. Martinho para suas Consoadas, pelo Alvará no Livro 17 de Sentenças, fl. 185; e ratificou por outro Alvará de 19 de Setembro do mesmo ano (fl. 247). Daqui em diante cobrou ao Mosteiro a metade da dita fruta seca, e aos Comendatários, tudo o mais. Depois que o Senhor Rei D. João IV restituiu ao Mosteiro a dita Comenda, entrou na posse, e cobrança de todos os direitos e dízimas da Alfândega, e de pescado assim como o faziam os Comendatários e lhe estava julgado.
No ano de 1644, passou a Senhora Rainha Dona Luísa [2], um Decreto ao Juiz de Fora de Óbidos para que fizesse sequestro em todos os direitos reais que este Mosteiro levava no porto de S. Martinho, não lhe mostrando os Religiosos, títulos por onde lhe pertencessem [lhes provassem pertencer]. E procedendo o dito Juiz de Fora na dita diligência, lhe foram apresentados por parte do Mosteiro os títulos que havia, entre os quais foi a Sentença do ano de 1578, por treslado, com que se deu por satisfeito por não proceder ao sequestro; e remeteu tudo à Senhora Rainha, e no seu Cartório da Ouvidoria se acham, segundo consta da Certidão no Livro 33 de Sentenças, fl. 219. Continuou o Mosteiro na sua posse de cobrar os direitos assim das mercadorias como do pescado, sobre o que houve várias Sentenças no Juízo dos Direitos Reais, que constam no Livro 7.º de Sentenças, fls. 169, 178, 325, 339, 373 e 376; no Livro 10.º fl. 243; e no Livro 19º, fl. 15.
No ano de 1665, deu o Mosteiro força no Juízo da Coroa contra o Conde da Atouguia e Senhor das Berlengas porque com violência, por seus criados, e rendeiros, queria que os pescadores de S. Martinho que iam pescar ao mar das Berlengas, lhe pagassem a ele os direitos, estando o Mosteiro em posse de os ditos pescadores os virem pagar em S. Martinho; e se julgou no ano de 1674 que o dito Conde fazia força ao Mosteiro em querer levar os ditos direitos - Livro 20 de Sentenças, fl. 159. E a fl. 153 se registou na Câmara de Peniche. E no Livro 27, fl. 227, a liquidação de perdas e danos.
 No ano de 1715 demandou o Mosteiro certos pescadores de Salir do Porto por não quererem pagar a dízima do pescado. A esta ação veio o Procurador da Sra. Rainha com oposição, dizendo lhe pertenciam todos os direitos, assim de mercadorias como de pescado que entrava pela foz. O Mosteiro se defendeu mesmo mal. E por isso teve Sentença contra si, julgando-se pertencer tudo à Sra. Rainha, e só ao Mosteiro o que se pescar dentro no seu limite de S. Martinho. Esta Sentença se executou, e tomou posse. Depois o Mosteiro a embargou, e estão pendentes os embargos. E quanto aos caídos em que o Mosteiro foi condenado, lhes perdoou a Sra. Rainha pelo Alvará no Livro 33 de Sentenças, fl. 216.
No Livro 19 de Sentenças, fl. 520, está uma resposta que deu o Administrador da Câmara a respeito da dízima de uma caravela.
Inquirição de testemunhas que o Mosteiro deu no ano de 1745 para provar os embargos com que veio a demarcação que por ordem da Senhora Rainha se fez na vila de Salir do Porto, na parte que confronta com S. Martinho e Alfeizerão (Liv. 40 de Sentenças, fl. 1).
 Sentença proferida no Juízo da Coroa, contra a Câmara de Salir do Porto, e Juiz e Feitor da Arrecadação dos Direitos Reais da mesma vila em 18 de Março de 1800, sobre direitos do pescado (Livro 61 de sentenças, fl. 1).
Um Requerimento do Procurador do Real Mosteiro de Alcobaça ao Juiz dos Direitos Reais para se porem editais para se pagar ao dito Mosteiro a dízima de todo o peixe que se pescar na barra de S. Martinho para dentro, conforme a sentença acima (Livro 61 de sentenças, fl. 110). Um requerimento do procurador do Real Mosteiro ao Juiz de Fora das Caldas para fazer observar na parte que lhe toca, a sentença acima sobre o direito de pescado em S. Martinho (Livro 61 de Sentenças, fl. 112).

Dízima do Mar
Quanto à vila da Pederneira[3]
[Fólio 37, Img 45]
Instrumento de como o Concelho da Pederneira se queixou ao D. Abade de lhe não consentir pescar na Lagoa todo o ano (Livro 1.º Dourados, fl. 71 v.º).
Instrumento de como o Concelho da Pederneira confessou que a Lagoa da Pederneira é coutada, e sem licença do D. Abade se não podia pescar (Livro 1 Dourados, fl. 68).
El Rei D. João II, no ano de 1491, estando na Pederneira, escreveu ao D. Abade e lhe roga não faça mal aos que pescaram na Lagoa, porque o fizeram por seu mandado e à sua Corte (Livro 1, Dour., fl. 45).
Privilégios concedidos aos pescadores (Liv. 1 Dourados, fls. 41 e 41 v.º).
Protesto feito por parte do Mosteiro sobre a dízima das mercadorias de uma nau da Índia que no ano de 1510 aportou com temporal no porto da Pederneira (Livro 5º de Prazos, fl. 43).
Sentença da Relação dada no ano de 1557 contra o Concelho e pescadores da Pederneira, que sempre no Verão tenham duas barcas de pescar, e não vão todas navegar (Liv. 1 de Sentenças, fls. 358 e 368).
Sentença do Juiz Conservador Apostólico contra os oficiais da Câmara da Pederneira por se intrometerem a dar licença aos pescadores para pescarem na Lagoa [«alagôa»], pertencendo isso ao Mosteiro (Liv. 4 de Sentenças, fl. 209; outra no L. 9, fl. 236).
Sentença do Juiz dos Direitos Reais contra António Moniz [?: «Múz»], Domingos Soares, Francisco Soares e outros moradores da Pederneira por irem pescar na Lagoa sem licença do Mosteiro, estando-lhe proibido com penas (Livro 7 de Sentenças, fl. 103) [4].
Petições e papéis do Bispo Capelão-mor Comendatário deste Mosteiro, por onde consta que das madeiras que se embarcam, ainda que seja para naus da Índia, se deve dízima (Livro 19 de Sentenças, fl. 510 em diante).
Sentença do Juiz dos Direitos Reais proferida em 18 de Março de 1747 contra os pescadores do termo da Pederneira, condenando-os a pagar os direitos de todo o peixe que pescarem com armadilhas ou ameijoeiras, e que, ocultando, pagaram 6000 réis (Livro 39 de Sentenças, a fl. 548).

Lagoa da Pederneira
[Fólio 165, Img 172]
Sentença D’El Rei dada no ano de 1455 contra os moradores dos Coutos, que sejam obrigados a abrir a lagoa da Pederneira quando o Dom Abade mandar (Livro 1.º Dourados, fl. 72; e Livro 3.º de Sentenças, fl. 87).
Sentença contra os moradores de Évora e Aljubarrota, para que vão abrir a dita Lagoa (Livro 6.º Dourados, fl 25 v.º).
Mandado do Ouvidor passado no ano de 1618 para os concelhos de Aljubarrota, Évora e Maiorga mandarem abrir a dita Lagoa, [com] pena de mil reis cada pessoa que faltar (Livro 3.º de Sentenças, fls. 90, 91, e 92).
Declaratória do Juiz Conservador contra a Câmara da Pederneira, por impedir que ninguém pescasse na Lagoa sem sua licença, de que ela desistiu (Livro 4.º de Sentenças, fl. 209).
Sentença do Juiz dos Direitos Reais contra António Moniz [?] e outros por irem pescar à Lagoa da Pederneira sem licença do Mosteiro (Livro 7.º de Sentenças, fl. 103).

Barcas de pescar
[Fólio 11, Img 19]
Carta do Infante dada no ano de 1429, que manda ao Almoxarife de Óbidos que entregue o direito e portagem da barca de S. Martinho ao Mosteiro de Alcobaça (Livro 6º dos Dourados, fl. 126).
Absolvição que se deu a um pescador de S. Martinho que não deu a dízima ao Almoxarife de Óbidos, por ser do Mosteiro de Alcobaça, ano de 1426. (Livro 6º Dour., fl. 126).
Despacho do Ouvidor dos Coutos com alçada, em que manda que as Justiças da Pederneira não obriguem os barcos que pescam para o sustento do Mosteiro a outras cousas, para que não falte a dita pescaria. Ano de 1598 (Livro 17 de Sentenças, fl. 133).

Navios
[Fólio 185, Img 193]
Conforme ao foral da vila da Pederneira, no capítulo 45, se deve pagar Dízima dos Navios que pessoas de fora ali carregarem, e tirarem para fora ou aí fizerem, e tirarem, e isto a dinheiro do que verdadeiramente valerem. O mesmo é no porto de S. Martinho, cujo foral se remete ao da Pederneira.
O modo deste pagamento da dízima dos tais navios, ou outras embarcações, é avaliar-se antes que se lance ao mar, e de toda essa valia pagar o dono a dízima inteira. Mas como geralmente se faz concerto aos Rumos, dizendo que querem fazer uma embarcação de tantos Rumos, de seis, ou dez, e quando se fizer este concerto advirta-se que se declare ao dono que declare de quantos sobrados, ou cobertas, quer fazer a embarcação, para assim se fazer o concerto. Cada Rumo tem seis palmos, e se medem por baixo da quilha desde o convés até abaixo da proa, enquanto vai a quilha direita; e sendo o navio que leve duas cobertas, o mais favor que se pode fazer é a dois mil reis cada Rumo, e se forem três cobertas, a três mil reis; e dos barcos longos de uma coberta, mil reis cada Ruma, e sendo de duas, dois mil reis.
Sentença da Coroa sobre um agravo que o Mosteiro tirou do Juiz Ordinário da vila da Pederneira, por se intrometer a fazer Inventário de um navio que deu à costa na praia, julgou-se bem feito, mas que havendo dúvida sobre direitos reais, seja diante do Juiz de Alcobaça, na forma dos forais, ano de 1682 (Livro 22 de Sentenças, fl. 135).
Carta do Secretário de Estado, Diogo de Mendonça Corte-Real, escrita em 11 de Fevereiro de 1732, ao Padre Geral, em que dá conta que Sua Majestade resolvera em consulta que o Juiz de Alcobaça não podia por em arrecadação e Inventário, um navio biscainho carregado de ferro que deu à costa em S. Martinho, porque isto pertencia ao Juiz da Alfândega de Peniche (Livro 33 de Sentenças, fl. 330).

Baleia
[Fólio 12 v.º, Img 21]
Instrumento de protesto e requerimento que fez o Mosteiro sobre uma baleia que os oficiais da Pederneira levaram do seu porto por ordem d’El Rei (Livro 1º dos Dourados, fl. 63).
Instrumento por onde consta receber Dom Jorge de Melo, Abade de Alcobaça, um talento que saiu em S. Martinho por lhe pertencerem os peixes reais que saírem em seus portos e estar em posse de os receber (Livro 6º dos Dourados, fl. 134).

Peixe da Pederneira e S. Martinho
[Fólio 253, Img 262]
Na vila da Pederneira se paga a dízima de todo o pescado que se pescar na forma do Foral, e como já fora declarado na letra D, título da Dízima do Mar.
Os pescadores de S. Martinho que aí pescarem para comer, não devem pagar nada, mas se venderem o pescado, devem pagar a quinta parte. E as outras pessoas que aí pescarem devem pagar a dízima, ou décima, porque assim o explica o Foral da dita vila.
De todo o pescado que se matava no mar e entrava pela foz, e também de todas as mercadorias se pagava ao Mosteiro uma dízima como mais largamente fica declarado na letra D, título da Dízima do Mar, a qual por ora se não arrecada, porque se julgou à Sr.ª Rainha, sobre o que pendem embargos. E sem embargo do que ia lá no título da Dízima do Mar, ficam apontados os títulos que há, se apontam aqui várias sentenças mais por extenso.
Sentença do Juiz dos Direitos Reais contra Mateus Mendes, de S. Martinho, pelo quinto do peixe que pescou na sua barca, que aqui se liquidou (Livro 7 de Sentenças, fl. 325). Idem, contra João Nunes, pescador de S. Martinho, e aqui se declaram os condutos que se lhe dão (Livro 7.º de Sentenças, fl. 339). Idem contra Domingos Dias (Livro 7, fl. 363);  e Luís Fernandes (Livro 7, fl. 376).
Sentença do Juiz dos Direitos Reais contra Amador Velho, João Henriques, e Martinho Lopes, moradores em Salir do Porto por se levantarem com os direitos do peixe, e não os querendo pagar na Alfândega de S. Martinho (Livro 10 de Sentenças, fl. 243).
Contrato que fez o Mosteiro com os pescadores de S. Martinho sobre o conduto que se lhe havia de dar (Livro 13 de Sentenças, fl. 94, às avessas).
Sentença do Juiz Conservador Apostólico contra Francisco Cavaleiro pela injúria que fez a um Feitor do Mosteiro que ia cobrar os direitos da sardinha no porto de S. Martinho e lhos não querer pagar (Livro 21 de Sentenças, fl. 81).
Sentença do Juiz Conservador Apostólico contra o vigário de S. Martinho, que os quarteiros e carreteiros, aos Domingos e dias santos, podem carretar o pão e os pescadores, pescar (Livro 9 de Sentenças, fls. 385 e 401).
Licença que concedeu o Arcebispo de Lisboa aos moradores da vila de S. Martinho, para que nos Domingos e dias santos possam ir pescar para as Confrarias (Livro 27 de Sentenças, fl. 150).
[Seguem-se várias sentenças, requerimentos e provisões sobre a pesca na lagoa da Pederneira, algumas delas já antes listadas neste livro].


Detalhe do «Livro das Fortalezas Situadas no Extremo de Portugal e Castela por DUARTE DE ARMAS, Escudeiro da Casa do Rei D. Manuel I», fólio 144 (Direção Geral de Arquivos/TT, Códices e documentos de proveniência desconhecida, n.º 159)

Fábrica das Igrejas
[Fólio 46 v.º, Img 55]
Quando se ventilar a que moradores pertence ornamentar e fabricar as igrejas destes Coutos, pertence [a resposta] à Causa no Juízo da Coroa. Nele correu com a de Alfeizerão sobre a mesma matéria, de que está a cópia da Sentença no Livro 43 delas, fl. 416, e com a da Cela, está a Sentença no fl. 263 do Livro 42; e declinando os de Turquel, foram por Acórdão obrigados a responder no mesmo Juízo (Livro 43 das Sentenças, fl. 212 v.º).

Vinculados a Capelas, e Morgados que não podem ser os Bens de Prazos
[Fólio 295, Img 299]
Treslado da sentença que no ano de 1605 alcançou Martim Luís [5], da Pederneira, contra Diogo Lopes de Sousa, e seu filho Álvaro de Sousa, pela qual se julgou na Casa da Supliciação que a quinta da Mota, no termo de Alfeizerão, não podia ser vinculada por ser Prazo deste Mosteiro (Livro 2.º de Sentenças, fl. 309).

Sentença do Ouvidor confirmada na Relação no ano de 1621 contra Ambrósio [Pereira] Pestana, e seu sucessor Fernão Pereira, pela qual se julgou que de todas as fazendas que tinham nestes Coutos, somente o Campinho podia ser vinculado em Morgado, e todos os mais não, os quais eram uma sesmaria no termo da Cela, e de Alfeizerão (que agora chamam Casais dos Raposos), quatro courelas nas várzeas adiante da Roda, um casal e quintal à Porta de Fora, e outras casas grandes no cabo do Rossio com uns edifícios novos, e um olival além do rio, um pomar à frente da Eliceira, e umas casas térreas na Rua de Baixo, e que todas estas dentro de 6 meses fossem desobrigadas de Morgado. Livro 4.º de Sentenças, fl. 548; e pela sentença no fl. 633 foram julgados por livres e depois tudo se vendeu.
Livraria
[Fólio 164 v.º, Img 172]
Consentimento da comunidade e Provisão do Reverendíssimo para se ____ [tragam?] à Livraria deste Mosteiro os direitos das Quintas de S. Gião e Ourém (Livro 46 de Sentenças, fls. 35 e 36).
Treslado da Provisão do Reverendíssimo por que a assina [«asigna»] com unânime consentimento da comunidade de que a compra dos livros para a Livraria, a renda da Caneira Velha, termo de Torres Vedras, e manda haja bibliotecário a que se entregue a dita renda e compre os livros necessários (Livro 47 de Sentenças, fl. 182).

Injúrias
[Fólio 75, Img 83]
Juízes e outras pessoas condenadas por atuarem e ofenderem os Religiosos.
Sentença do Juiz e Conservador Apostólico proferida em 1603, e monitório que se passou, em virtude da mesma, contra o Juiz de Alfeizerão, António Velho do Couto e seu escrivão António Correia de Almeida, por autuarem o Procurador do Mosteiro que em audiência lhe falou forte, e os condenou em 500 cruzados, e nas penas da Bula da __ [?]. Livro 20 de Sentenças. Fl. 371. Sentença do Juízo da Coroa, aonde no ano de 1604 recorreram o mesmo Juiz e Escrivão, e não tiveram provimento (no mesmo Livro, fl. 440).
Sentença do Vigário Geral de Santarém proferida contra João Roiz Curto, do Casal da Nuna, termo da Pederneira, e o condenou em vinte cruzados e um ano de degredo para a vila de Tomar, porque injuriou o Irmão Fr. Bento do Espírito Santo (Livro 17 de Sentenças, fl. 23).
Sentença do Juiz Conservador Apostólico dada no ano de 1675 contra Francisco Cavaleiro e Tomé Martins da vila de S. Martinho, em que foram condenados em pena pecuniária e excomunhão pela injúria que fizeram ao Religioso que cobrava os direitos do peixe, dos quais vira [?] injuriando de palavras e puxando de uma faca para lhe darem, e dando com um pau no seu criado (Livro 21 de Sentenças, fl. 81).

Igreja de S. Martinho e Igreja de S. João Batista de Alfeizerão
[Fólio 105, Img 113]
Da ereção e fundação da igreja de S. Martinho não consta ao certo, porém esta povoação teve princípio na Era de 1295, que fica sendo no ano de Cristo de 1257, porque então se lhe deu Carta de foro e povoação, que consta do Livro 6.º dos Dourados, fls. 123 e 124. E neste tempo parece se erigiu a igreja e paróquia.
Na Era de 1334, que fica caindo no ano de Cristo de 1296, por mandado do Bispo D. João Martins de Soalhães se fizeram e deram rol dos limites às freguesias que então havia nestes Coutos, que eram só cinco, e deram por limite à igreja de S. Martinho, além do dito lugar em que ela estava, a Torre de Framondo (isto é, o castelo da Cavalariça, que assim se chamava, e o lugar a que chamam Torre) e Alfeizerão, e o Bacelo, e todos os seus termos (Livro 2.º dos Dourados, fl. 82).
No dito Alfeizerão se fez capela, em que os moradores daí ouviam Missa.
No ano de 1337 foi colado um capelão perpétuo da igreja de S. Martinho, Marcos Martins, por apresentação deste Mosteiro (Livro 2.º Dourados, fl. 94).
No ano de 1425 apresentou o Abade D. Fernando, e mais Convento, a Gonçalo Vicente, clérigo de missa, para curar em sua vida às igrejas de Alfeizerão e S. Martinho, e que haveria pela servidão que assim havia de servir, a saber, o que entrar pelas portas das ditas igrejas, fora a dízima da igreja de Alfeizerão, que pertencia ao dito Mosteiro, e que haveria mais as falhas, e dois moios de trigo em cada ano, pago em Alfeizerão ou em Famalicão, e que houvesse mais todas as dízimas dos moradores de S. Martinho e seu termo desde onde morasse João Vicente e Lopo Anes, e mais todas as miunças e dízimos dos gados, e mais todo o direito do vinho, fora o direito do quinto da Sacristia, e que o dito Gonçalo Vicente tirasse Carta em cada um ano à sua custa (Livro 15 de Sentenças, fl. 257). Além do referido lhe dá o Mosteiro 2800 reis de ensinar a Doutrina.
No ano de 1434, se julgou por sentença que o dito Gonçalo Vicente se houvesse os dízimos dos moradores de S. Martinho, ainda dos que lavrassem em Alfeizerão, e os moradores de Alfeizerão que lavrassem em S. Martinho; pagariam o dízimo ao Mosteiro (Livro 15 de Sentenças, fl. 312).
No ano de 1557, se obrigou o povo a sustentar a Capela do Espírito Santo [de S. Martinho?] que tinha feito e paramentá-la à sua custa (Livro 35 de Sentenças. Fl. 418).
No ano de 1591 se julgou contra o vigário Lourenço Fernandes, que lhe não pertencia a dízima de um barco de sardinha salgada que veio de Peniche (Livro 2.º de Sentenças. Fl. 306).
No ano de 1612, se deu sentença na Legacia contra o vigário de S. Martinho sobre os quintos das vinhas que se intrometia a cobrar (Livro 9.º de Sentenças, fl. 139).
No ano de 1625, sendo vigário de Alfeizerão e S. Martinho o Padre João Batista, deu força contra este Mosteiro pelos dízimos do peixe salgado que entrava pela foz de S. Martinho e pelos quintos do vinho da dita freguesia, que dizia estava de posse de tudo, e o Mosteiro a forçara, mas foi absoluto, ficando ao dito vigário direito reservado sobre a propriedade (Livro 18 de Sentenças, fl. 308).
Depois o dito vigário João Batista demandou ao Mosteiro ordinariamente para que lhe largasse a cobrança dos dízimos do peixe salgado que entrasse pela foz de S. Martinho e o 5.º dos vinhos da dita vila e lhe pagasse o dízimo dos frutos da Quinta que tinha na mesma vila, e foi julgado na Legacia que o dito vigário pertenciam os dízimos do peixe seco, mas os quintos dos vinhos lhe não pertenciam, mas ao Mosteiro, e que em quanto este, por si ou seus criados, cultivassem a Quinta, não deviam pagar o dízimo. Consta no Livro 12 de Sentenças, fl. 328.
No ano de 1537, mandou o Cardeal Infante D. Afonso, Comendatário deste Mosteiro, pelas Cartas do Livro 15 de Sentenças, fls. 218 e 219, a seu Procurador, o Licenciado [«L.do.»] André Lopes, que se informasse, ouvindo os concelhos dos Coutos, quem era obrigado a pagar os custos das fábricas das igrejas dos Coutos, assim do corpo da igreja, como da Capela-mor, e ornamentá-la; e fazendo a dita diligência com os concelhos de S. Martinho e de Alfeizerão a respeito da fábrica das ditas duas igrejas, declararam o que consta do Livro 15 de Sentenças, Fls. 222 e 224. E no ano de 1538, foi visitada a igreja de Alfeizerão, sufragânea da de S. Martinho, na qual se proveu várias coisas para a fábrica da dita igreja (Livro 15 de Sentenças, fl. 252).
Sendo Comendatário o Infante D. Fernando de Castela [era filho de Filipe II], fez concerto com os povos de algumas das igrejas dos Coutos sobre lhe pagar para a fábrica delas uma certa quantia anual, e com efeito a dita igreja de Alfeizerão se pagavam oito mil reis e à de S. Martinho, dois mil reis. E depois, no ano de 1681, se fez nova fábrica de quatro mil reis para a igreja de S. Martinho (Livro 29 de Prazos, fl. 29).
No ano de 1697, fizeram os oficiais da Câmara e Povo de Alfeizerão, como fabricaram da sua igreja uma justificação sobre a ruína dela, e de quem levou os materiais (Livro 31 de Sentenças, fl. 239).
No ano de 1719 se fez uma justificação por parte do Mosteiro em como as paredes da igreja de Alfeizerão se fizeram de novo com dinheiro que estava depositado de acréscimo das sisas, e outro que se tirou das Confrarias, e que as madeiras que estavam para a fábrica da dita igreja e telha, as levaram várias pessoas, como também algumas pedras com licença dos Fabricários [sic], e que o Mosteiro, para a dita obra, não concorreu com coisa alguma (Livro 35 de Sentenças, fl. 171).
O Eminentíssimo Patriarca 1.º de Lisboa não quis estar pelas ditas fábricas anuais, por se lhe não mostrarem autorizadas pelo Ordinário, e pretende que o Mosteiro as fabrique à sua custa de todo o necessário.
No ano de 1634, concedeu o Mosteiro à Confraria do Santíssimo Sacramento de Alfeizerão por modo de doação e esmola, uma terra junto ao castelo, com obrigação de pagar dela somente o dízimo (Livro 15 de Sentenças, fl. 114).
No ano de 1618 se julgou na sagrada Rota [o Tribunal da Rota Romana] contra o Arcebispo de Lisboa, que todas as igrejas destes Coutos são anexas e do padroado in solidum deste Mosteiro, e por isso não podem ser postas em concurso, cuja sentença e decisão está no Caderno 20, Gaveta 3.ª do Caixão.
No ano de 1642, por falecimento do Cardeal Infante D. Fernando, Comendatário deste Mosteiro, lhe restituiu o Ilustríssimo Rei D. João IV a dita comenda e tudo o que a ela pertencia, em virtude do que tomou o Mosteiro posse do padroado das ditas duas igrejas (Livro 20 de Sentenças, fl. 9 e 21).
No ano de 1517, o Comendatário deste Mosteiro, D. Jorge de Melo, apresentou e colou em vigário das ditas duas igrejas de S. Martinho e Alfeizerão, a António Vieira, seu capelão, e no ano de 1525 o confirmou o Cardeal Infante D. Afonso, Comendatário deste Mosteiro e administrador do Arcebispado de Lisboa (Livro 31 de Sentenças, fl. 1).
No ano de 1532, foi colado pelo Cardeal Infante D. Afonso, Arcebispo de Lisboa e Comendatário deste Mosteiro, Rui Vieira, como vigário de S. Martinho e sua anexa, S. João de Alfeizerão (Livro 15 de Sentenças, fl. 308).
No ano de 1656, sendo vigário das ditas igrejas, João Batista, fez renúncia delas ao padre Antão Carreira, sem licença do Mosteiro, que recorreu ao Ordinário, e fez citar o dito Antão Carreira para exibirem termo de três dias as Bulas, para as embargar de objetícias e subjetícias [sic] e por não as exibir no dito termo, se passou mandado anulatório, como consta do Livro 28 de Sentenças, fls. 95 e 99. Por bem do que não teve efeito a dita renúncia.
No ano de 1674, vagaram as ditas igrejas por falecimento do dito João Batista, e o Mosteiro apresentou nelas o dito Antão Carreira, que foi colado no dito ano (Livro 31 de Sentenças, fl. 53).
No ano de 1678, foi apresentado e colado nas ditas igrejas de S. João de Alfeizerão, e sua anexa de S. Martinho, a António Roiz Quaresma, por vacatura do dito Antão Carreira (Livro 31 de Sentenças, fls. 129 e 133).
No ano de 1685, foi apresentado e colado nas ditas igrejas de S. João e S. Martinho, o padre António Cerveira do Souto. Consta tudo do Livro da Dataria, fl. 318.
No ano de 1734, foi apresentado e colado nas ditas igrejas de S. João Batista de Alfeizerão e sua anexa de S. Martinho, o Doutor Manuel Romão (Livro 28 de Sentenças, fl. 113; e Livro da Dataria, fl. 218).
Instrumento [?] e Termo que fez a Câmara de S. Martinho sobre o conserto da igreja (Livro 36 de Sentenças, fl. 516).
Sentenças e Sobre-sentenças do Juízo da Coroa de 1760 e de 1761 em que o Mosteiro foi condenado a fazer e ornamentar a igreja de Alfeizerão (Livro 43 de Sentenças, a fl. 526).
Termo que fizeram em 24 de Junho de 1766, o Juiz e oficiais da Câmara da vila de S. Martinho, declarando tinham por esmola um sino que o Mosteiro lhe deu, sem que desta ação capitulasse e pudesse ser o Mosteiro obrigado a paramentar a igreja de S. Martinho. Livro dos Prazos, fl. 239 v.º; Livro 36 de Sentenças, fl. 516.
No ano de 1696, fizeram o prior e fregueses de S. Martinho à sua custa, o primeiro sacrário da dita igreja: compraram véstias, pálio, ceras, e se obrigaram a o azeite da lâmpada do Santíssimo [Sacramento]; consta tudo isto de uma certidão extraída do próprio original, assim como da Licença para se dizer missa na capela de S. António da mesma vila. Livro 63 de Sentenças, a fl.__.


Detalhe do «Livro das Fortalezas Situadas no Extremo de Portugal e Castela por DUARTE DE ARMAS, Escudeiro da Casa do Rei D. Manuel I», fólio 48 (Direção Geral de Arquivos/TT, Códices e documentos de proveniência desconhecida, n.º 159)

Miscelâneas
[Fólio 295, Img 304]


Resposta que se deu ao vigário de Alfeizerão sobre a feitura [«fattura] da nova igreja, a que o Mosteiro não é obrigado (Livro 34 de Sentenças, fl. 521).

Igreja de Nossa Senhora da Vitória de Famalicão
Filial da igreja da Pederneira
[Fólio 117, Img 125]
Os fregueses da Igreja de Nossa Senhora da Vitória de Famalicão foram desanexados da igreja matriz da vila da Pederneira, e alguns da de Alfeizerão por Bula Apostólica no mesmo tempo em que se desanexaram as outras igrejas novas de Salir e do Vimeiro, que foi no ano de 1565, sendo Comendatário o Cardeal Infante D. Henrique, a qual nova igreja os ditos fregueses erigiram e fizeram à sua custa, como eles mesmos confessaram no Livro 15.º de Sentenças, fl, 242.
No ano de 1577 passou o dito Cardeal Infante D. Henrique, Comendatário deste Mosteiro, uma Provisão pela qual concinou [concedeu?] a João Fernandes, capelão da igreja nova de N. Sra. Da Vitória de Famalicão, de côngrua cada ano de 12 mil reis em dinheiro, um moio de trigo e uma pipa de vinho (Livro 15 de Sentenças, fl. 272)
No ano de 1578, o mesmo Infante Cardeal D. Henrique proveu, por morte do dito João Fernandes, a Fernande Anes em vigário da dita igreja de Famalicão, e haveria a mesma côngrua que tinha o dito João Fernandes seu antecessor.
No ano de 1614, fizeram os fregueses da dita igreja, petição ao Bispo Dom Pedro de Castilho, governador do reino e Procurador e administrador do Cardeal Infante D. Fernando, Comendatário, para que mandasse visitar a dita igreja e provê-la do necessário, confessando que eles a erigiram, e o dito Bispo lhe pôs por despacho que, obrigando-se eles à fábrica da dita igreja toda que fizeram à sua custa, o Senhor Infante mandaria ornamentar a Capela-mor (Livro 15 de Sentenças, fl. 242).
No mesmo ano de 1614, fizeram os ditos fregueses escritura em que se obrigaram a fabricar a dita igreja toda que seus antepassados fizeram à sua custa, e isto de tudo o que fosse necessário à dita igreja e aos seus altares colaterais (Livro 15 de Sentenças, fl. 243). Depois disto, [com] o mesmo Cardeal Infante D. Fernando foi feita fábrica de dois mil reis cada ano, tanto [?] para a fábrica do altar-mor; e assim se observou muitos anos; porém depois a comenda veio ao Mosteiro: se não satisfizeram os dois mil reis declarados, antes o Mosteiro tomou sobre si a dita comenda do altar-mor. Mas porque não contribuía com todo o necessário, tornaram os fregueses da dita igreja a pedir a este Mosteiro lhe tornasse a contribuir com os ditos dois mil reis cada ano para a fábrica do altar-mor, e com efeito se fez a escritura no ano de 1670, com condição que os ditos dois mil reis se não gastariam senão na fábrica da dita capela-mor, porque a fábrica de toda a igreja pertencia aos fregueses (Livro 15 de Sentenças, fl. 231). Em Mesa de Fazenda de 1 de Setembro de 1799 se lhe acrescentaram mais 200 [?] reis.
Em algumas visitas se mandou que o Mosteiro mandasse fabricar de ornamentos e outras coisas a dita igreja de Famalicão e outras. E no ano de 1736 se mandou fazer sequestro, a que se opôs o Mosteiro, recorrendo ao Eminentíssimo Cardeal Patriarca com o fundamento acima referido, de que não era obrigado à fábrica e reparos da dita igreja, o qual no ano de 1737 declarou por seu despacho que o Mosteiro não era obrigado à dita fábrica, e que pelos Capítulos da visita se não procedesse, e por outro despacho declarou que a prestação anual de dois mil reis se aplicaria na forma estipulada na escritura, em virtude de que o Vigário Geral mandou não se procedesse contra o Mosteiro, e houve por levantado o sequestro que tinha feito, ficando o Mosteiro só obrigado a contribuir anualmente com os dois mil reis, e que se satisfizesse o que se estava devendo; o que o Mosteiro replicou, que suposto se devessem os ditos dois mil reis desde o ano de 1726, contudo depois disso tinha dado por conta da dita fábrica vários ornamentos e obras para a dita igreja, que deviam ser avaliados, e a sua importância se devia compensar na dita fábrica; e com efeito se fez a avaliação, mas o Vigário Geral não deferiu a dita compensação [«compenção»] que poderia requerer por outra via, como também os fregueses [ou cofres?] da igreja poderiam haver por outra via os atrasados, como tudo mais largamente consta da sentença no Livro 33 delas, fls. 17 e 249.
Pelo dito modo são os fregueses obrigados a toda a fábrica da dita igreja, e o Mosteiro somente a dar-lhe dois mil reis cada ano para a fábrica da capela-mor. Estes dois mil reis se devem desde o ano de 1726 em diante; mas na sua importância se deve descontar o valor das obras e ornamentos que o Mosteiro deu e fez na dita igreja, e enquanto não estiverem satisfeitos do dito valor, não deve contribuir com os ditos dois mil reis.
Não consta no Cartório da avaliação das ditas coisas, e sua importância, somente no Livro 35 de sentenças, fl. 179, está um rol de tudo o que fez no cômputo da avaliação que se há-de achar nos autos de que se extraiu a sentença de que acima se faz menção. Bom será saber esta certeza.
No ano de 1738, deixou um Visitador um capítulo que o Mosteiro acudisse à ruína que ameaçava a dita igreja, o qual revogou por dizer [?], declarando ser esta obrigação dos fregueses (Livro 35 de Sentenças, fl. 177)
No ano de 1605 se decidiu e julgou na Rota Romana, que a dita igreja e todas as mais dos Coutos são anexas a este Mosteiro, e do seu padroado in solidum, e por isso não deviam ir a concurso, cuja sentença está no Caderno 20, na Gaveta 3.ª do Caixão.
Colação do padre José Pinto para vigário desta igreja, apresentado pelo Mosteiro (Livro 55 de Sentenças, fl. 2).
Em 19 de Março de 1801 se celebrou escritura de contrato com o vigário de Famalicão e fabriqueiros [6] dando-se-lhe adiantados quarenta e oito mil reis, ficando pagos os _____ [dois mil reis?] que se lhe dão cada ano para a dita fábrica, e só principiarão a receber acabados os dez anos que tiveram princípio no dia de São João Batista de 1801. Notas ____, Livro 25 de Privilégios, fl. 286. Se fiscalizará em 1811 [«fiscalozara»].

Cartas Reais
[Fólio 22, Img 30]
Cartas que respeitam à milícia e fatura de soldados e cavalos, e outras que respeitam ao Forte de S. Martinho (No dito Livro 1º [de Cartas Reais], do fl. 168 até 263).
Cartas pelas quais os reis pedem ao Padre Geral, madeira das matas para navios, e que ordenem às Câmaras que as façam conduzir (Liv. 2º de Cartas Reais, de fl. 278 até 297).
Carta D’El Rei D. João III em que pede madeira da mata (Liv. 95 de Sentenças, fl. 380).

Privilégios e Mercês Reais[7]
[Fólio 211, Img 219]
Na Era de 1286, que fica sendo no ano de Cristo de 1248, fez El Rei D. Sancho II do nome, e 4.º rei de Portugal, seu testamento, estando em Toledo, deposto do governo do Reino. Manda-se sepultar neste Mosteiro, e lhe deixa a vila de Porto de Mós, a vila de Cornaga [Tornada] no termo de Óbidos, e o porto de Salir [Livro 1.º Dourados, fl. 32 v.º).
Na Era de 1332, [D. Diniz) concedeu que este Mosteiro pudesse mandar seu vinho e sal para fora sem embargo das posturas em contrário (Livro 1.º dos Dourados, fl. 30 v.º).
A 15 de Julho de 1482 da Era de Cristo, doou a Rainha D. Leonor ao Mosteiro, as dízimas dos navios que descarregavam em S. Martinho, e mandou aos seus Juízes e oficiais de Óbidos que não perturbassem a posse em que o Mosteiro estava pela Doação de D. Pedro I (Livro 6.º Dourados, fl. 125).
A 4 de Junho de 1579 [o Cardeal Rei D. Henrique] houve por bem que os frades deste Mosteiro tenham em cada ano, e para sempre, a metade da renda da fruta seca que se pagava de dízimo no porto da vila da Pederneira à [para a] mesa abacial, assim e da maneira que se arrecadaram por ele como Comendatário do dito Mosteiro. E a 4 de 1575 concedeu da mesma sorte a metade do que viesse ao porto de Salir de S. Martinho, que era para as suas consoadas (Livro 17 de Sentenças, fls. 185 e 247) [8].
A 28 de Fevereiro de 1635 [Filipe III] concedeu que o Mosteiro pudesse embarcar duzentos moios de sal, dízimo mais ou menos de suas salinas de S. Martinho, sem dele levarem direitos, e que nos portos do dito Mosteiro se não possa descarregar sal algum sem consentimento do dito Mosteiro, exceto no caso de grande necessidade (Livro 31 de Sentenças, fl. 28).
A 17 de Dezembro de 1640 [D. João IV] passou Carta de Propriedade do ofício de Ouvidor e Avaliador dos bens dos Órfãos das vilas de Alvorninha, Salir do Mato, Santa Catarina e Alfeizerão, a Sebastião Machado (Maço 1.º de Privilégios, n.º 23, Gaveta 1.ª).
A 20 de Agosto de 1735, passou a rainha D. Mariana d’Áustria, mulher D’El Rei D. João V, alvará pelo qual fez mercê de perdoar a este Mosteiro os rendimentos vencidos da foz de Salir do Porto, que por sentença se tinham julgado pertencerem à dita Senhora Rainha (Livro 33 de Sentenças, fl. 216).
Por sua resolução de 6 de Dezembro de 1754, [D. José I] mandou que Manuel Pedro da Silva de Fonseca [«Affonseca»] fosse preso pelos excessos que fazia, e [se] lançasse fora os touros (Livro 89 de Sentenças, a f. 251) [9].
Provisão de 26 de Outubro de 1778 e 4 de Abril de 1780, de 25 de Junho de 1790, de 6 de Maio de 1791, e Aviso de 3 de Julho de 1790, para o Mosteiro tomar dinheiros a juros para distrate e continuação da obra na Livraria (Caixão das 3 chaves, Gaveta 1; e o Livro 34.º de Sentenças, fl. 285).

Demarcação dos Coutos
[Fólio 40, Img 48]
Instrumento de Contenda que no ano de 1493 teve o Mosteiro com a Rainha D. Leonor sobre a demarcação de terras dos Coutos com a vila de Óbidos, e se julgou por Sentença que era pela foz de Salir, e daí pela Madre da Água do rio de Salir acima (Livro 2.º de Sentenças, fl. 59; e um treslado raro no Livro 3.º, fl. 29, e outro no Livro 26, fl. 73). Sentença dada no Juízo da Coroa no ano de 1569 entre o Comendador-mor D. Afonso de Lencastre, donatário da vila de Salir do Porto, pela qual se julgou que a demarcação é pela veia da água do Rio doce que chamam da Mota [«Motta»], até se meter na foz do mar em Salir (Livro 27 de Sentenças, fl. 46).






NOTAS E NOTA FINAL

[1] Este, como outros documentos aqui referidos, foi indicado pela Doutora Iria Gonçalves, no seu valioso estudo sobre O património do Mosteiro de Alcobaça nos séculos XIV e XV.

[2] Rainha Dona Luísa de Gusmão (1613-1666), esposa de D. João Resposta que se deu ao vigário de Alfeizerão sobre a feitura [«fattura] da nova igreja, a que o Mosteiro não é obrigado (Livro 34 de Sentenças, fl. 521).IV.

[3] Transcrevo apenas algumas das sentenças indexadas.

[4] Sentenças semelhantes contra Francisco de Almeida e Jerónimo Vaz.

[5] No meu bosquejo genealógico sobre a família dos Britos da Pederneira, encontro um Martim Luís, que era fruto da união de dois primos, Antónia de Brito (ou de Sousa) e António de Brito da Costa.

[6] Fabriqueiro, era aquele que cobrava as rendas da igreja (António de Moraes SILVA, Diccionario da Lingua Portugueza, Tomo Segundo, Tipografia Lacerdina, Lisboa, 1813).

[7] Este capítulo começa com a Doação de D. Afonso Henriques aos cistercienses; documento que, com detalhes evocativos, se descreve encontrar-se no Livro 1.º Dourado, f.º 1, e a Original na Gaveta 1.ª do Cayxão dentro em huma bolsa de Damasco Carmesim, com seu letreiro por fóra. De outra carta do mesmo rei para o mosteiro, uma Carta de Feudo, é-nos dito que se encontra no mesmo lugar em huma bolsa de chamalote verde.

[8] Repare-se na inversão de papéis causada pela decadência do porto de Salir (e do de Alfeizerão). Se no reinado de D. Dinis encontrávamos documentalmente S. Martinho de Salir, duzentos anos depois, temos aqui Salir de S. Martinho.

[9] Esta figura seria, presumivelmente, o pai de Francisco Manuel de Fonseca e Silva que, no ano de 1797, detinha uma grande propriedade que se compunha da maioria dos campos de Alfeizerão, segundo declara José Rino de Avelar Fróis numa entrevista ao jornal O Alcoa de 20 de Outubro de 1949, que já reproduzimos nesta página. Nesta família entroncaria a família dos Fróis, ou Fonseca Fróis (pelo menos, assim o pretendia José Rino de Avelar Fróis). No título dedicado ao Alcaide-mor de Alfeizerão, aponta-se, no exercício desse cargo, Silvério da Silva da Fonseca que, por uma outra fonte (o manuscrito de António José Sarmento), sabemos ter sido apresentado como Alcaide-mor a 1 de Outubro de 1623.

NOTA FINAL:

A totalidade das passagens que escolhemos transcrever do Livro de Privilégios... está publicada neste Ficheiro em Formato PDF, editado em fonte Monotype Corsiva.

No primeiro post que criamos sobre esta obra, reproduzimos o índice do livro, no intuito de servir como orientação a quem queira conhecer melhor a obra, ou o que ela contém sobre as outras terras dos Coutos de Alcobaça.