quinta-feira, 20 de novembro de 2014

O DICCIONARIO GEOGRAFICO do padre Luís Cardoso


                 O Diccionario Geografico... do padre Luís Cardoso, foi publicado em dois tomos em Lisboa nos anos de 1747 e 1751, nas vésperas do Grande Terramoto. Os dois tomos foram digitalizados pela Biblioteca Nacional de Portugal, e encontram-se disponíveis para leitura, ou para transferência do ficheiro.
                No primeiro tomo surge-nos, naturalmente, Alfeizerão, e transcrevemos na íntegra o que aí se encontra, completando a transcrição com imagens da obra original.



                ALFEYZIRAM, Alfazeyrão, Alfeizerão, ou Alfeizirão. Em latim Eburobricium. Villa na Provincia da Estremadura, Patriarcado de Lisboa, Comarca de Leiria; he dos Coutos de Alcobaça, de que são Donatarios os Geraes de Alcobaça; tem com seos arrabaldes oitenta fógos. Está situada em campina, entre as Villas da Pederneira, e Caldas; de cada huma das quaes dista duas legoas; descobremse della parte da Freguesia de Famalicão, serra da Pescaria, a Villa de S. Martinho, a de Selir do Porto, o Lugar, e Freguesia da serra do Bouro, a Freguesia, e Lugar de Tornada, e o Castelo de Obidos. No Termo comprehende os Lugares de Macarca, Rebollo, Famalicão debaixo, Mata da Torre, Val da Maceira, Valado, Mosqueiros, e Casalinho.
A Paroquia está no fim da Villa da parte do Poente, (acha-se demolida há quarenta annos, por cuja causa serve de Paroquia a Ermida do Espirito Santo, sita no coração da Villa”). O Orago da Freguesia he S. João Bautista: tem a Ermida tres Altares, no mayor está hum Santo Christo, Imagem devotíssima, que dizem deu o Cardeal Infante, quando assistio no Castello desta Villa; ao lado direito a Imagem de S. João Bautista, e ao esquerdo S. Vicente, o Altar collateral da parte da Epistola he de Santo Antonio, com a imagem do mesmo Santo; o da banda do evangelho he de Nossa Senhora do Rosario, com a mesma Imagem, e também a de S. Sebastião. Há nesta Igreja a Irmandade do Santissimo Sacramento, à qual se uniram as Irmandades que havia do Espirito Santo, e S. João.
O Paroco chama-se Vigario, he apresentação do Dom Abbade Geral de S. Bernardo, de Santa Maria de Alcobaça: tem de congrua dous moyos e oito alqueires de trigo, e dous mil e oitocentos reis em dinheiro, que lhe dá o Mosteiro de Alcobaça: tem os dizimos das aves de penna, e a porta da Igreja, he juntamente Prior de S. Martinho, e por isso se intitula o Paroco Vigario de Alfeizerão, e Prior de S.Martinho. Tem esta Villa Hospital administrado pela Camera, com tão curta renda, que apenas suppre a despeza de mandarem conduzir os pobres para os outros Hospitaes. Está no arrabalde da Villa huma Ermida de Santo Amaro, com a Imagem do mesmo Santo, que tem feito muitos milagres, e no seu dia tem bastante concurso de devotos; estão no mesmo Altar as Imagens de S. Braz, e Santa Catharina.
A mayor parte dos frutos da terra he feijão, milho, trigo, cevada e vinho mediano. Tem dous Juízes ordinarios de Sizas, e Orfãos, tres Vereadores, hum Procurador do Concelho, e dous Almotacés. Esta Camera he confirmada pelo Donatario Dom Abade Geral de Alcobaça, faz-se a eleição de pelouro triennal pelo Ouvidor do mesmo Donatario. Está sojeita à Correição de Leiria; tomaõ conhecimento o Corregedor, e Provedor, por aggravo; e por appellação o Ouvidor do Donatario.
He tradição, que Viriato foy natural desta terra, no tempo em que era Cidade chamada Eburobrico [sic], situada da parte do Nascente desta Villa, no sitio chamado hoje Ramalheira, aonde se achaõ ainda hoje vestigios de aliceces [sic].
Tem feira em dia de Santo Amaro, para o que se alcançou Provisão no anno de mil setecentos e sete, com a merce de ser o terrado para augmento, e obras da Casa do Santo, de cuja Provisão pedio vista o Donatario , e cobra-se o terrado para o Mosteiro; dura tres dias e não he franca. Não se fazem Soldados nesta terra, por ser vissinha de S. Martinho, porto de mar, com Forte, aonde acodem quando há rebate; e por essa razão se não obrigarão os Auxiliares a continuar o presídio das Praças do Alentejo nas guerras passadas. 
A agua da fonte desta Villa he tepida de Inverno, e fria de Verão, e tão delgada, que não consta nesta terra houvesse pessoa, que bebendo della, padecesse queixa de pedra. Ha tambem da parte do Sul desta Villa, distante meyo quarto de legua, huma chamada lagoa limpa, em que se criaõ muita quantidade de sanguixugas [sic], da melhor qualidade dellas conforme a approvação dos Medicos; e indo variedade de animaes beber à dita lagoa, nenhuma se lhe péga; e se algumas levaõ, que tenham apanhado em outras partes, alli as largaõ da boca e ficaõ livres.
Foy porto de mar antigamente, de que ainda junto da Villa existem vestigios do caes. Tem Castello arruinado parte delle, e ainda existem os sobrados das casas, em que assistio o Cardeal Infante. Tem Alcaide môr, que he data do Donatario. Pela parte do Nascente desta Villa, distancia de tres, ou quatro tiros de bala, estão huns montes, ou oiteiros, entre os quaes corre o rio, que passa pela frente desta Villa, da parte do Sul, cousa de tres tiros de espingarda; chamaõlhe o rio grande; o seu nascimento he por cima da Villa de Santa Catharina, que dista desta duas leguas. A este se ajunta, no Lugar chamado das Mestras; o rio do Carvalhal bem feito, e ultimamente se mete, e incorpora no destricto de Charnaes, o rio que vem dos Rebellos, e Junqueira, Lugares da Freguesia da Cella; e o que vem do Lugar do Vimeiro não he caudaloso: corre do Nascente a Poente, da Villa de Selir do Porto, entra na barra da dita Villa do Sul para o Norte. Não tem arvoredos, mais que alguns salgueiros, e choupos, em partes, e em outras fabricaõ se as suas margens. Tem huma ponte de pedra nesta Villa, por baixo de cujos arcos já não corre agua por entulhados das areas; usão livremente os moradores das suas aguas, e com elas regaõ muitas fazendas; ha umas marinhas no destricto desta Villa, junto ao vao de Selir, que confinaõ com outras daquella Villa; junto dellas há hum chamado lago, que fez Pedro da Silva da Fonseca, que algum tempo trazia muita abundancia de peixes, mas hoje se acha entulhado.













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