segunda-feira, 27 de julho de 2020

José Rino de Avelar Froes nas Incursões Monárquicas de 1911-12

José Rino de Avelar Froes (1888-1966), filho de Vitorino de Avelar Froes e Júlia Máxima Pereira Rino, estuda em Lisboa onde tira a licenciatura no Curso Diplomático e, coincidindo com a sua maioridade, assiste à implantação da República em 5 de Outubro de 1910. Monárquico até à medula e apoiante de D. Manuel II, ruma ao norte e junta-se às forças monárquicas que tentarão a restauração da Monarquia sob o comando de Paiva Couceiro. Participa nas duas frustradas incursões monárquicas de 1911-1912 e em 1919 está entre os monárquicos sob o comando de Aires de Ornelas que em Monsanto tentam iniciar uma revolta na capital que una forças e esforços com a Monarquia do Norte. Após a vitória republicana em Monsanto, José Froes é encarcerado com outros elementos do contingente monárquico vencido. Quinze anos depois do ocaso monárquico de 1919, e em virtude da sua qualidade de produtor de resina e director da União Resineira Nacional, integra a Câmara Corporativa onde fez carreira como parlamentar. Na sua terra natal, ajudou muito os desfavorecidos da vida através da instituição Casa do Povo de Alfeizerão, tendo como seu amigo e conselheiro o padre João de Matos Vieira.

Das obras de Joaquim Leitão sobre as Incursões Monárquicas, recolhemos duas passagens sobre o José Froes. Estas obras de Joaquim Leitão mostram-nos sobretudo as movimentações dos monárquicos no país vizinho, viajando por todo o lado a tentar reunir fundos e adquirir armas para a causa, ao mesmo tempo que tentam iludir a desconfiança das autoridades espanholas e as denúncias de republicanos dos dois lados da fronteira - numa teia de peripécias e aventuras de índole quixotesca que o autor narra com uma cativante simplicidade.

«(…) Sob um croquis, traçado por mão perita, José Foes José Fróes»], um dos nove cavaleiros andantes da incursão das Beiras, um chauffeur Angel e um carpinteiro construíram um falso num automóvel Morse [marca norte-americana de carros, surgida um ano antes e que era novidade]. Três dias levou a fazer a obra. Finda ela, o automóvel seguiu, só com o chauffeur, para o ponto N; ao mesmo tempo, José Froes saía, em comboio, de S. Sebastian para a cidade de Victoria.

«Dá um nome francês no livro dos hóspedes e, com o porte de um fidalgo que tivesse morto touros em Salvaterra, prepara o proprietário do hotel:

- Ao meio dia deve chegar o meu automóvel, que teve uma panne cerca de Bilbao , onde ficou a consertar. Avise-me logo que chegue.

«Às doze e um quarto, pouco mais ou menos, desse dia de Maio, luminoso e quente, apareceu o automóvel, contendo no fundo falso oitenta granadas que no ponto N recebera.

«Saltou José Fróes para o carro, e o automóvel continuou a sua derrota: Victoria – Burgos – Léon – Palencia – Astorga – Valdeôrras – Rua Petin.

«De Rua Petin iam para Ginzo. Por Verin? Por Orense? Podiam ir por uma estrada directamente a Ginzo, evitando Verin e Orense. Desconheciam-na. Resolveram ir por Verin.

«Dois carabineiros, em Verin, fizeram parar o automóvel. Examinaram, só viram mantas. As granadas dormiam no fundo oco do automóvel.

- Quien son ustedes? – inquiriram os carabineiros.

«José Fróes puxou pelo cartão dum amigo que conhecera em Biarritz, e deu ao carabineiro, que leu: “Le comte J. Romanet du Cailland”

- Hombre! – disse o carabineiro para o camarada – Dejalos passar que és un conde francês!...

- Pues… andar!

- I donde se marcha Vd., señor conde?

- A Vigo – respondeu José Froes.

«E seguiu. Á porta do Hotel Salgado estavam portugueses. Reconhecendo o automóvel e supondo que nele fosse algum dos proprietários do carro, tiraram respeitosamente o chapéu. Quando os carabineiros deram pelo logro, gritaram:

- Parar! Parar!

«O carro já ia em andamento; os carabineiros obtiveram em resposta o pé no acelerador».

(LEITÃO, 1914, pp. 200-201).

*

«Eram as seis da tarde. Já se distribuía o rancho; carneiro com arroz e cinco decilitros de vinho. O arroz mal lavado, vinha com pedras, mas assim mesmo o comiam, que a fome era realmente para devorar pedras. No seu preceito de não aceitar, em campanha, tratamento diferente do dos seus soldados, Paiva Couceiro determinou que nas rações para a escolta lhe fosse incluída a dele que seria igual à de todos, observando-se a mesma regra para o chefe do Estado-Maior.

«No pelotão dos cadetes reinava impenitente alegria. José Froes e Rodrigo Castro Pereira tinham apresentado aos cadetes o seu Pégaso: um jerico comprado por doze mil réis para lhes transportar as bagagens. Coxo, cego, o “conspirador” que os cadetes não acreditavam que deitasse até Chaves, foi todavia festejadíssimo. Sobre este intervalo cómico, os cadetes haviam voltado para a sua toilette. Barbeavam-se uns, penteavam-se outros, pédicuravam-se alguns, quando as sentinelas deram voz de alerta.

«Tudo se precipitou para os sarilhos, como estava: José Froes, que tinha os pés num alguidar de água, correu descalço a meter-se na forma; Francisco Paes de Sande e Castro, que espetava naquele momento o alfinete na seda da gravata, uniu em mangas de camisa, sem colete, só de calção e cinto, como um bóer; José Pedro Folque, com metade da cara barbeada e metade cheia de sabão; e sem confusão, sem hesitações, numa entusiástica e ordenada presteza, a Coluna formou, pronta a bater-se. A gente do campo gritava:

- O inimigo! O inimigo! Vem aí o inimigo! – e enquanto os soldados corriam para as armas, todos esses camponeses, prestimosos e entusiastas, desapareciam, passando-se uma parte da povoação para Espanha.

- É uma cobardia, é uma cobardia! – gritava o capitão Ferreira para os artilheiros que correram a armar as peças.

- Não acho cobardia nenhuma os homens irem para os seus lugares. Se eles fugissem!... – Contrapôs o Conde de Mangualde, tirando o relógio.

- Mas é uma precipitação.

- Deixe lá. Isto quando não sirva para mais nada, serve para a gente ver quanto tempo, num momento de aperto, os homens levam a armar as peças, com aquele diabo daquela mola duríssima do freio que só ajudando com o rodar é que se tem conseguido meter.

- É uma cobardia, vá-se com esta! – insistiu o capitão Ferreira.

- Cobardia ou não – concluiu o Conde de Mangualde – o que sei é que eles levaram minuto e meio a montar as peças. Não desgostei de saber. Agora desmontem as peças! – ordenou aos artilheiros.

«Era rebate falso: apenas um rebanho de ovelhas que ao longe parecera ás sentinelas do bivaque o avizinhar das forças inimigas».

(LEITÃO, «Em marcha para a 2ªa Incursão», 1915, pp. 195-197)

 

 

 

FONTES E AFLUENTES:

CHAGAS, Alvaro Pinheiro, «O Movimento Monarchico», t. I, Editores Leitão & C.ª, Porto, 1913

DIAS, C. Malheiro, «O Estado Actual da Causa Monarquicha, 1912-1913», Typographia-Editora José Bastos, Lisboa.

LEITÃO, Joaquim, «Couceiro, o Capitão Phantasma», edição do autor, Porto, 1914

LEITÃO, Joaquim, «A columna de Couceiro (a 1.ª Incursão)», edição do autor, Porto, 1915

LEITÃO, Joaquim, «Em Marcha para a 2.ª Incursão», edição do autor, Porto, 1915

NETO, Sérgio, «Do Minho ao Mandovi – Um estudo sobre o pensamento colonial de Norton de Matos», Imprensa da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2016.


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