domingo, 21 de setembro de 2014

Vitorino Avelar Fróis - um alfeizerense de coração



O abastado proprietário rural Vitorino Avelar Fróis, é uma figura incontornável no Portugal dos primeiros anos do século vinte, e da História recente de vila de Alfeizerão. Nascido em Alfeizerão em 1862, gizou a sua vida entre a sua Quinta em Alfeizerão (a Quinta Nova de S. José) e o seu palacete em S. Martinho do Porto, e os jornalistas e autores de crónicas do seu tempo, cognominavam-no de “alfeizerense” ou de “coração alfeizerense”.

Percorrendo a Web, encontramos menos dados propriamente biográficos do Vitorino Fróis (“Victorino Froes”, se grafava na época), do que a repetição de alguns quadros truculentos ou picarescos da sua vida que, seguindo o mote, aqui trazemos, com algumas ilustrações a acompanhar.

Assim o descreve Fleming de Oliveira:
Pessoa muito estimada, de fino trato e bem relacionada, era das relações do Rei D. Carlos que o chegou a visitar mais que uma vez Alfeizerão e ali fazer piqueniques, com uma personalidade vincada, algo marialva e extravagante, de farto bigode retorcido e bem-apessoado, tinha a fama, embora não saibamos se o proveito, de ser um apreciador do belo sexo (…) Fróis tinha na sua ganadaria um touro que começou a ser amestrado logo à nascença. Quando havia visitas na quinta e Vitorino Fróis as queria impressionar, avisava que tinha uma surpresa, mas que para isso, seria em absoluto necessário que todos se mantivessem tão calados e sossegados, quanto possível. Então mandava o animal entrar na sala, seguro por umas cordas, por mera precaução, por dois empregados, a fim de dar a volta à mesa. Os convidados ficavam estupefactos, assustados nalguns casos, e as senhoras davam gritinhos histéricos”.

Na sua Quinta, a agricultura não era mais importante do que a criação de gado equino e bovino, porque Fróis era, além de criador de touros para a festa brava, um exímio cavaleiro tauromáquico, mais propriamente, um mestre dos cavaleiros tauromáquicos, que iniciou a técnica do “tourear de caras”, depois desenvolvida por João Núncio.

Aliás, a criação de cavalos era já uma tradição e um dos predicados da Quinta Nova de São José, como o comprova o Relatório Agrícola de 1856 (seis anos anterior ao nascimento de Fróis): 
A raça equina de Alfeizerão, sem ser propriamente fina, era uma raça boa e muito acreditada. O cavalo não era grande, mas atingia ordinariamente a marca para a remonta da cavalaria do exército. Era nervoso, sanguíneo e muito aturador, colo comprido, pouco farto de crina, um tanto delgado e graciosamente contornado, cabeça sobre o comprido, mas descarnada, orelha grande, boa venta, olhos vivos, peitos e mãos excelentes, quarto traseiro descaído e pernas curvas. Tais eramos caracteres distintivos da raça em que parece havia muito de Alter. Uma grande parte dos cavalos eram zainos, tinham fama de ásperos, mas de excelentes depois de adestrados[1].

Na Quinta do Fróis criavam-se touros para corridas em todo o país, e adestravam-se cavalos para a arte taurina, ai afluindo alguns nomes imortalizados no meio, como Simão Luís da Veiga, de Lavre (Montemor-o-Novo). Vitorino Fróis e Simão da Veiga apadrinharam a estreia no toureio a cavalo do Príncipe Real D. Luís Filipe de Bragança na Real Praça de Touros do Vidigal. Em 1881, Vitorino Fróis arrenda a Praça de Touros da Nazaré, cujo contrato incluía o direito de organizar as três touradas que se realizavam durante as festas de Nossa Senhora da Nazaré, e dez anos mais tarde, renova o contrato por um período de doze anos (artigo citado de António Valério Maduro). Foi durante esse período em que explora a praça de touros da Nazaré, no ano de 1886, que perece na arena o cavaleiro Maradas, uma celebridade da época, trespassado por um touro.

Amigo pessoal do rei D. Carlos, que recebe na sua Quinta de Alfeizerão, ou no seu palacete de S. Martinho do Porto, onde o rei e a sua família veraneiam em três anos diferentes, costumava também Vitorino Fróis visitar o rei na sua Quinta do Vidigal, Vendas Novas, para tratar de assuntos relacionados com a criação de gado e para conviver e caçar com o monarca. Numa dessas visitas, conta Águedo de Oliveira [2], “ao ensaiar uma lide a cavalo, mestre Vitorino Fróis viu-se desmontado e quase liquidado pelo padreador “Couraça”. Rapidamente, o rei [D.Carlos] puxou duma carabina, e atirou de frente quando o touro avançava, abatendo-o dum só tiro”.




Muitas outras histórias (e lendas) se contam sobre Vitorino Fróis, como as que teriam ocorrido durante uma viagem a Espanha, que alguns afirmam nunca ter acontecido. Mas ouçamos a narrativa, uma vez mais, pela “voz" de Fleming de Oliveira:

Vitorino Fróis foi fazer uma corrida a Espanha, o que aliás acontecia com regularidade, estimulada pela tradicional rivalidade entre portugueses e espanhóis, bem como pela respetiva afición. Antes do início da corrida, o seu encarregado dos cavalos, veio comunicar-lhe que tinha visto um indivíduo, às escondidas, a aguçar com uma grosa, os chifres do toiro que lhe saíra na sorte para lidar. Perante isto, Fróis ordenou ao empregado que fosse, de pronto, comprar duas navalhas (…) que depois, também sem que ninguém o visse, as amarrasse abertas nos cornos do boi. Quando o corpulento e negro animal de quinhentos e muitos quilos, entrou a babar-se na arena e o público se apercebeu da situação, entrou como que em histeria. Vitorino Fróis saiu-se muito bem, sem que as pontas das navalhas tocassem ainda que ao de leve o cavalo, pelo que no fim da lide, foi na boa tradição tauromáquica espanhola, levado da arena em ombros. Perante tamanho arreganho, Fróis foi convidado por um grupo de aficionados para um jantar de homenagem. Estando já todos à mesa, um empregado negro abeirou-se dele e disse-lhe subtilmente que não jantasse, porque corria o risco de ser envenenado… Fróis arranjou uma desculpa qualquer, e já não assistiu ao jantar. No dia seguinte, convenceu o negro a ir morar para a quinta de Alfeizerão e, ao mesmo tempo, comunicou à família e empregados, entre os quais o feitor António Tempero Júnior (pai de José Tempero) que aquele iria por lá ficar enquanto quisesse, com direito a cama, mesa e roupa lavada. E assim foi durante alguns anos até que acabou por regressar à sua terra”.

Para finalizar, reproduzo do blogue “À Antiga Portuguesa”, as imagens (desconheço a proveniência) de um lide de “toro de puntas” realizada em 1910 na Quinta do Fróis em Alfeizerão:







José Eduardo Lopes





[1] “Arte Equestre e Praça de Touros da Nazaré”, artigo de António Valério Maduro de 14 de Janeiro de 2010, coligido em “50 Coisas de Escrita Vária Alcobacense” de António Maduro e Rui Rasquilho, co-edição do CEPAE – Centro do Património da Estremadura e da AMA – Amigos do Mosteiro de Alcobaça, ano de 2011.
[2] Oliveira, Águedo de, “D. Carlos – Atirador de Caça”, edição conjunta da Fundação “Os Nossos Livros” e Escola Superior Agrária de Santarém, 1992.

1 comentário:

  1. Boa noite,após a leitura de alguns artigos que naturalmente gostei,dirigo-me a este blog solicitando ajuda na identificação de um postal que adquiri há uns anos,sem qualquer identificação, mas que julgo tratar-se de Alfeizerão...neste sentido e porque não me ocorre outra forma de contacto ,deixo meu mail na esperança de que me possa contactar para poder responder com o envio da imagem.Grato Miguel Chaby miguelchaby@gmail.com

    ResponderEliminar