domingo, 30 de outubro de 2016

Maria Domingas - breve evocação da sua carreira artística

              MARIA DOMINGAS nasceu em Alfeizerão a 11 de Setembro de 1921, e foi batizada com o nome de Maria Domingas da Cunha Meneses. Era filha de Francisco da Cunha Meneses e de Adelaide Baiana da Silva, residentes na vila. O seu pai, nascido na freguesia de S. José em Lisboa, era filho do 6.º Conde de Lumiares, enquanto a mãe, nascida em Alfeizerão, possui ascendentes na vila que se podem seguir nos assentos paroquiais de Alfeizerão até ao século XVIII.





                O seu primeiro trabalho no cinema foi como figurante no filme Maria Papoila de 1936, quando contava apenas quinze anos. Quatro anos depois, Jorge Brum do Canto convida-a para ser a protagonista feminina do filme João Ratão (1940). O filme segue a história de um jovem, João Ratão (Óscar de Lemos) que é convocado para a guerra na Flandres e que ao regressar à terra natal, se vê envolvido num triângulo amoroso com a sua noiva, Vitória (Maria Domingas) e uma mulher de posses, Manuela (Teresa Casal). O filme conhecerá um enorme sucesso, em grande parte devido à sua componente musical, onde se destaca o Fado das Trincheiras, mais tarde imortalizado na voz de Fernando Farinha, e canções que nos dão a conhecer a musicalidade da sua voz, como a Cantiga da Primavera.




                Dois anos depois, Maria Domingas entra em Os Lobos da Serra, também sob a direção de Jorge Brum do Canto, um filme dramático ambientado em paragens raianas, onde António (o ator António de Sousa), noivo de Margarida (Maria Domingas), se deixa enredar nas teias do contrabando para fazer face às dificuldades que atravessam.



                Em 24 de Setembro de 1947 é estreado o filme seguinte da carreira de Maria Domingas, Bola ao Centro, com argumento e realização de João Moreira, com Jorge Brum do Canto a supervisionar as filmagens; e que contaria com Alves Redol na escrita dos diálogos. O filme conta a história de um jovem apaixonado pelo futebol, Zé António (José Amaro) que para se tornar jogador abandona a família e a noiva, Maria Leonor (Maria Domingas), e ingressa num clube de futebol da capital. Aí, depois de um começo promissor embelezado por falsas promessas de carreira e pela trepidante vida noturna citadina, Zé António vê o seu sonho frustrado, o que o leva a regressar desencantado à sua terra, onde se reconcilia com Maria Leonor e consegue um emprego modesto, caindo de imediato no esquecimento daqueles que antes o aplaudiam.



                O título seguinte da filmografia de Maria Domingas acontece apenas doze anos depois. O Primo Basílio, adaptação cinematográfica de António Lopes Ribeiro da obra homónima de Eça de Queirós sobre a relação adúltera entre Luísa e Basílio. Neste filme, Maria Domingas desempenhará um papel secundário numa produção que contará com atores como Ribeirinho, João Villaret ou Manuel Santos Carvalho.



                O último filme em que Maria Domingas participou, no papel de uma viúva, foi A Cruz de Ferro (1968), filme realizado pelo cineasta que a descobriu, Jorge Brum do Canto e que também participa no filme como ator. Como em outros filmes deste realizador, a ação desenrola-se no campo, e a tensão dramática do enredo gira em volta de duas aldeias que disputam entre si a posse da água.

                Em paralelo com a sua carreira cinematográfica, Maria Domingas, desenvolve a sua participação no teatro. Foi no Teatro de Revista que Maria Domingas mais se destacou, chegando a ser uma atriz de primeira grandeza, e tendo contracenado com os maiores nomes da época, chegando a trabalhar em todos os teatros do género. Também trabalhou como atriz teatral no Brasil e em Moçambique, país onde viveu durante alguns anos.
                O final dos anos sessenta do século vinte assinala a retirada de Maria Domingas da vida artística, movida por razões de foro pessoal.

                De salientar que Maria Domingas sempre manteve uma forte ligação à sua terra, onde manteve uma casa e onde passava grande parte dos seus tempos livres. Também era aí que estanciava durante as tournées pelo país, recebendo outros atores em animados serões que as pessoas ainda recordam com agrado. Refira-se ainda que Maria Domingas se propôs para ser juíza da Festa de Santo Amaro em 1967, facto que não concretizou devido ao seu casamento em 1966, tendo delegado esse cargo numa pessoa de sua confiança.

(Revista Animatógrafo, 2ª. Série, nº. 51, 27 de Outubro de 1941)

terça-feira, 18 de outubro de 2016

MARIA DOMINGAS - a sua genealogia paterna

Maria  Domingas, numa cena do filme João Ratão

     Depois de aqui termos trazido alguns dados sobre a genealogia da atriz Maria Domingas, tentaremos complementar esse apontamento com informações sobre a sua ascendência paterna, tema que havíamos descurado na nossa publicação anterior.

     O pai de Maria Domingas, Francisco de Assis da Cunha e Meneses, nascido em 1874, era um dos filhos do 6º. Conde de Lumiares, D. José Manuel da Cunha Faro e Meneses Portugal da Silveira. Antes de falarmos deste fidalgo e das origens do título, começaremos por recordar aqui um dos seus avoengos mais ilustres, Martim Afonso de Sousa.

O César das Índias

Martim Afonso de Sousa
Martim Afonso de Sousa

     Martim Afonso de Sousa nasce em Vila Viçosa numa data imprecisa próxima ao ano de 1490, e descendia de uma das mais antigas famílias do reino, os Sousa ou Sousa Chichorro. Numa carta (de Novembro de 1545) de um primo seu, Aleixo de Sousa, ao governador da Índia, D. João de Castro, lembra-se ao destinatário da carta que «a minha geração (des que há Reis em Portugal) foi sempre das mais honradas do Reyno, e ouve sempre nella muitos honrados homens» (PELÚCIA, p. 33). Pelo seu estatuto de nobre, Martim Afonso de Sousa passou os primeiros anos da sua juventude na corte, sendo pajem do Duque de Bragança, e do infante D. João, futuro rei de Portugal.

     Estudou matemática e cosmografia, e com a subida de D. João III ao trono, Martim Afonso de Sousa é encarregue pelo rei de acompanhar a Castela, Dona Leonor, viúva do Rei Venturoso. Em Castela, combate os franceses sob o comando do rei D. Carlos V, e ainda no reino vizinho contrai casamento com D. Ana Pimentel, uma mulher nobre. Regressa a Portugal, integrando a comitiva que traz a Lisboa a irmã de Carlos V, Dona Catarina, para se casar com o rei português. Em Portugal é nomeado conselheiro da Coroa e D. João III escolhe-o para capitanear uma expedição ao Brasil. Esta expedição compõem-se da nau capitânia sob o comando de Martim de Sousa e do seu irmão Pêro Lopes de Sousa, o galeão São Vicente confiado a Pêro Lopes Pinheiro, a caravela Rosa capitaneada por Diogo Leite, e a caravela Princesa, sob as ordens de Baltasar Fernandes; parte do porto de Lisboa a 3 de Dezembro de 1530, e percorre as costas do Brasil onde combate e apresa navios franceses que aí se encontram; a expedição funda em seguida a primeira vila portuguesa no território, São Vicente. Frustrado nas suas buscas por ouro e prata, a presença de Martim de Sousa no novo continente acompanhará a aposta definitiva na agricultura e no cultivo da cana-de-açúcar, e a divisão do território em capitanias, ficando-lhe atribuída a capitania de S. Vicente que Martim Afonso governaria até ao seu regresso ao reino em meados de 1533. Um ano depois, é nomeado capitão-mor do mar das Índias, para onde se desloca para combater os corsários e mouros; consegue a concessão aos portugueses do lugar de Diu para se erguer uma fortaleza depois de auxiliar o sultão de Cambaia na luta contra os mongóis; e logra depois disso a defesa de Cochim, uma admirável vitória militar contra o rajá de Calecute e um novo triunfo sobre o mesmo potentado em 1538. Estando já em Lisboa, é nomeado vice-rei das Índias por D. João III em 1542, sucedendo aí a D. Estevão da Gama. O seu papel como vice-rei e administrador desfez a reputação que granjeara durante anos como capitão de guerra, abrindo um período de corrupção, debilidade estratégica e enriquecimento indevido. Em 1545, sucede-lhe D. João de Castro e Martim Afonso regressa a Lisboa no princípio de 1546, onde permanece como conselheiro da Coroa. Morre em Lisboa em 1571 e é sepultado no convento de S. Francisco, em Lisboa.

Sousas e Meneses – os condes de Lumiares

     A capitania de S. Vicente no Brasil manteve-se na família de Martim Afonso de Sousa. A sua neta, D. Mariana de Sousa Guerra foi a quarta donatária da capitania, transmitida às gerações seguintes da família: Luís Carneiro de Sousa, Francisco Carneiro de Sousa, António Carneiro de Sousa (agora Capitania de São Paulo e Minas de Ouro), Francisco Carneiro de Sousa e Carlos Carneiro de Sousa e Faro (Capitania de São Paulo), com o qual o título é extinto.

     António Carneiro de Sousa morreu sem descendentes, e é o seu irmão, Carlos Carneiro de Sousa e Faro quem se torna o derradeiro detentor do título, da mesma forma que foi o quinto Conde da Ilha do Príncipe, título nobiliárquico associado ao primeiro, e que tinha sido criado por Filipe III de Portugal em benefício de Luís Carneiro de Sousa, bisavô deste 5º. Conde.

     Tendo ficado sem o título de Conde da Ilha do Príncipe, Carlos Carneiro de Sousa e Faro (1710-1770) recebe em compensação o título de Conde de Lumiares por mercê do rei D. José I de 29 de Setembro de 1753. O brasão de armas do primeiro Conde de Lumiares é o dos Carneiros: em campo vermelho, com banda de azul, perfilada de ouro, carregada de três flores-de-lis do mesmo e acompanhada de dois carneiros de prata, armados de ouro. Timbre: um dos carneiros do escudo.

     Madalena Gertrudes Carneiro de Sousa e Faro (1737-1793), filha de Carlos Carneiro de Sousa e Faro e Ana Vicência de Noronha, será a segunda Condessa de Lumiares. Após o seu casamento com José Francisco Portugal da Gama e Vasconcelos, ostentará o nome de D. Madalena Gertrudes Portugal da Gama e Vasconcelos.

     Maria do Resgate Carneiro Portugal da Gama Vasconcelos Sousa Faro (1771-1823), filha do casal anterior, casou-se com Manuel Inácio da Cunha e Menezes (1742-1791), que deteve o título de Conde de Lumiares; mas após a sua morte, Maria do Resgate subsistiu como a terceira Condessa de Lumiares, tendo-se casado em segundas núpcias com Luís da Cunha Portugal e Meneses, seu cunhado.

     José Manuel Inácio da Cunha e Meneses da Gama e Vasconcelos Carneiro de Sousa Portugal e Faro (1788-1849), quarto conde de Lumiares, era filho de Maria do Resgate e de Manuel Inácio da Cunha e Menezes. Militar e político, foi brigadeiro, deputado, Par do Reino e Presidente do Conselho de Ministros. Faleceu no palácio dos Condes de Lumiares (freguesia de S. José, em Lisboa) no ano de 1849, e teve seis filhos, frutos do seu casamento com D. Luísa de Meneses, dama da rainha D. Maria I: D. José Félix da Cunha e Meneses; D. Francisco da Cunha e Meneses; D. Manuel da Cunha e Meneses; D. Luís da Cunha e Meneses; D. Carlos da Cunha e Meneses; D. Maria Nazareno da Cunha e Meneses.

     D. José Félix da Cunha e Meneses (1808-1843), era o filho mais velho dos precedentes e quinto conde de Lumiares. Casou-se em 8 de Junho de 1835 com Constança de Saldanha e Riba Fria e tiveram três filhos: José Manuel da Cunha Faro e Meneses Portugal da Silveira; Leonor da Cunha e Meneses e D. José Manuel da Cunha e Faro Meneses Portugal da Silveira.

     O mais velho, D. José Manuel da Cunha Faro e Meneses Portugal da Silveira (1836-1902), foi o sexto e último conde de Lumiares. Da sua esposa, Ana Amélia Pinto de Sousa Coutinho Balsemão, teve dez filhos, entre os quais se contava Francisco de Assis da Cunha e Meneses. O título de conde foi-lhe renovado em vida por decreto de 27 de Abril de 1858.

     Francisco de Assis da Cunha e Meneses (1874-1942), foi o pai de MARIA DOMINGAS da Cunha Meneses, nascida da sua união com Adelaide Baiana da Silva.

Francisco de Assis
da Cunha e Meneses


Fontes:
CASTELO BRANCO, José Barbosa Canaes de Figueiredo, Costados das familias illustes [sic] de Portugal, Algarves, Ilhas, e Indias, Volume 1, Lisboa, na Impressão Régia, ano de 1829.

MESQUITA, Manuel de Castro Pereira de; e CASTELO BRANCO E TORRES, João Carlos Feo Cardoso de, Resenha das familias titulares do reino de Portugal: Acompanhada das noticias biographicas de alguns individuos das mesmas familias, Imprensa Nacional, Lisboa, 1838.

PELÚCIA, Alexandra Maria Pinheiro, Martim Afonso de Sousa e a sua Linhagem: A Elite Dirigente do Império Português nos Reinados de D. João III e D. Sebastião, Universidade Nova de Lisboa Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Lisboa, 2007.


ANEXO 1
  Árvore de costados dos Condes de Lumiares.
(CASTELO BRANCO, José Barbosa Canaes de Figueiredo, Costados das familias illustes [sic] de Portugal, Algarves, Ilhas, e Indias, Volume 1, p 44, Lisboa, na Impressão Régia, ano de 1829).



ANEXO II
Algumas aditamentos aos títulos da família e às suas uniões e parentesco
(MESQUITA, Manuel de Castro Pereira de; e CASTELO BRANCO E TORRES, João Carlos Feo Cardoso de, Resenha das familias titulares do reino de Portugal: Acompanhada das noticias biographicas de alguns individuos das mesmas familias, pp. 115-117, Imprensa Nacional, Lisboa, 1838).